domingo, 6 de fevereiro de 2011

O escrutínio

Tal como eu tive ocasião de antecipar os temas que "animaram" a primeira semana da campanha eleitoral para a presidência da República, desaparecem quase com a mesma rapidez com que haviam nela aparecido, e com a mesma justificação, ou seja, nenhuma.

E porque é que tal acontece? Porque este tipo de escrutínio aos candidatos não está na nossa génese democrática.

Nos EUA, com as devidas diferenças, qualquer candidato é sujeito de forma prévia à sua (possivel) eleição a uma análise dos respectivos comportamentos privados, não valendo necessáriamente o principio do primado da reserva da vida privada.

Ou seja, aquilo que se é na esfera intima há-de ser aquilo que se será na actuação pública e este princípio é, a meu ver, profundamente correcto.

Em Portugal, bem pelo contrário, há um grande pudor por parte da classe jornalistica, em fazer aquilo que vulgarmente se chama de "jornalismo de investigação". Este tipo de jornalismo, quando conduzido com profissionalismo e isenção, teria um papel potencialmente decisivo na própria credibilização da classe política.

Por outro lado, não existe um cultura de exigência da população que de forma clara procure conhecer bem os candidatos que no futuro imediato irão conduzir os seus próprios destinos. Não é certamente de esperar que seja a classe politica a dar esse primeiro passo, na medida em que dele poderão ser os principais prejudicados.

O que sucede então em Portugal? Exactamente o oposto. Elegemos os nossos representantes e, quando começamos a ficar "fartos" deles, abrimos o baú e vasculhamos o seu passado, a maior parte das vezes sem critério (ou com critérios menos claros) e sem o necessário rigor jornalistico.

É muito mais dificil demover um politico depois de eleito do que antes dessa eleição e este princípio é válido em Portugal (onde existem politicos que não renunciam aos cargos mesmo depois de condenados) ou nos EUA. Atente-se no "escândalo" Clinton...

Analisando os casos mais recentes, qual foi o resultado prático de trazer para o dominio público as suspeitas sobre o curso do Eng. Sócrates, da ligação ao BPN e da compra da vivenda Algarvia do Prof. Cavaco ou da publicidade ao BPP do Dr. Alegre? Nenhuma, pois claro.

Bastou aos próprios dizerem que não era verdade ou remeterem-se ao silêncio para o que os assuntos morressem por eles próprios. Porquê? Porque se tratavam de processos que deveriam ter sido analisados e mesmo investigados na altura própria e não posteriormente, por mero oportunismo politico de circunstância. Perdeu-se, em suma, o sentido de oportunidade.

Enquanto não existir uma consciência geral de exigência ou da manifestação prática de que à mulher de César não basta parecer séria sem ter que o ser, continuaremos a "navegar" neste mare tranquillitatis em que se tornou o nosso País. Assim vão as cousas.

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