domingo, 26 de janeiro de 2014

A minha praxis

Desengane-se que possa suspeitar que as linhas seguintes serão dedicadas a "alimentar" uma verdadeira fornalha de informação e contra-informação sobre o que se terá passado na fatídica noite da praia do Meco ou mesmo algum ensaio geral sobre os caminhos da praxes nos nossos dias, algo que não tem faltado nos últimos tempos.

Parece-me bem mais interessante reflectir sobre algo que é transversal a este tema e que, creio, permite mais facilmente "perceber" as razões pelas quais - independentemente da mortes - este tema é hoje em dia tão discutido.

Não se pense sequer que esta "recusa" em abordar este tema pelo mesmo prisma em relação à generalidade do tempo e do modo como tem vindo a ser efectuado parte de uma premissa de desconhecer esta realidade pois também eu passei - em tempos idos - pela experiência de ser "praxado" quando formalmente e como "caloiro" fiz a minha entrada na universidade.

Talvez deva, aliás, ser este o ponto de partida para a análise que se segue na medida em que se tornou por demais evidente não ser já esta uma "tradição" de cariz universitária ou académica, pois passou também ela a ser comum em graus inferiores de ensino quando a própria noção de formação superior não será mais do que uma "miragem" ou, dito de outra forma, uma expectativa meramente futura.

Ora, neste alargamento do âmbito deste "ritual" de boas-vindas ou de aculturação de qualquer recém-chegado a um estabelecimento de ensino, está simultâneamente um factor de tradição mas igualmente cultural, ou seja, a presunção de que se chegou a um local e a um momento da vida que definirá - mais do que em qualquer momento anterior - o nosso próprio futuro.

Acontece que se a tradição "já não é o que era" não é menos verdade que a noção de cultura também já deixou de ser passível de entender no sentido em que provavelmente o foi durante largo tempo, isto é, a assimilação pessoal de um determinado estudo ou trabalho intelectual ou, num conceito mais genérico, a interiorização de sabedoria, instrução e do estudo.

A questão é que para se conhecer as tradições é necessário dispor de cultura pois é esta que nos permite dispor da "ferramenta" necessária à sua passagem pelos tempos, sem prejuízo de uma adaptação da sua adaptação a esse mesmo tempo, numa espécie de renovação.

Pode mesmo suceder que esse factor de tradição não exista de todo na medida em que qualquer nova tradição terá necessariamente de radicar num determinado momento que corresponda ao seu inicio que apenas o tempo ditará se passará ou não de geração para geração, sendo tal particularmente evidente no caso português fruto do surgimento de um conjunto relativamente alargado de "novas" universidades que, por definição, não estariam em condições de invocar qualquer tradição anterior à respectiva fundação.

Dessa forma, a ausência de tradição apenas poderá ser colmatada pelo recurso a um noção cultural do objecto e objectivo dessa mesma tradição nos locais onde ela tenha existido, independentemente de se manter ou não "viva" actualmente.

Por isso mesmo, a conclusão "à luz" do que se tem visto e ouvido é que o conceito de "praxe" é hoje em dia - embora seja importante que se diga que nem sempre - uma manifestação evidente da ausência cultura e dos valores mínimos de respeito pelas tradições, pelo simples facto que se desconhecem quais sejam.

É um sinal evidente e preocupante de uma geração que desconhece a separação entre o que é ou não aceitável e que revela uma igualmente preocupante tendência para o desrespeito pelo próximo, sendo que neste caso não é possível sequer invocar a diferenciação etária de tão próxima que ela é.

Creio, portanto, que a preocupação da sociedade em que esta nova geração de "doutores" se insere não deve passar pela abolição do "ritual" das praxes, mas sim pelo reforço de que o respeito pelo próximo é mais importante do que uma qualquer tradição por configurar um direito natural de qualquer pessoa.

Contudo, para que tal possa ser possível é fundamental que essa mesma Sociedade consiga valorizar a o conceito de Cultura numa base de valorização pessoal que, depois de conseguida, será certamente utilizada em beneficio da própria Sociedade e essa será certamente a maior tradição que poderá ser passada para as gerações futuras. Assim vão as cousas.


domingo, 19 de janeiro de 2014

O lado B

Ao longo dos quase 3 anos de crónicas semanais (ou dissertações consoante o entendimento de cada um) foram recorrentes as alusões à actual conjuntura económica e social de Portugal, fruto das consequências que, em ambos os níveis, daí têm decorrido para os portugueses e que - temo - não deixarão de se fazer sentir durante largos anos, independentemente de qualquer mudança que se possa verificar na direcção do Governo, por ocasião das próximas eleições legislativas.

Admitindo, porém, que tal como diz o ditado "não há mal que sempre dure" creio que é também possível e até mesmo de alguma justiça fazer por esta mesma via um registo de alguns dos principais elementos positivos de um tal período, mesmo que não pretendendo assumir que outros não haverão para além daqueles que se seguidamente se haverá de referir.

Em primeiro lugar e sem que daqui se possa inferir que se trata de uma qualquer espécie de competição, creio que uma das consequências positivas da crise foi o surgimento de uma convicção mais ou menos generalizada da necessidade de uma gestão mais eficaz dos rendimentos individuais ou, dito de outra forma, uma maior apetência para a poupança.

Em bom rigor não deveria ter sido necessário chegar a este ponto para que se chegasse a esta conclusão/necessidade mas - realidade incontornável - a menor propensão para a poupança é directamente proporcional à convicção por parte da "oferta" relativamente a uma maior disponibilidade das pessoas para o consumo, com especial relevo para os bancos que não deixaram de procurar cativar esse mesmo "apetite" a qualquer custo ou, no caso vertente, a qualquer preço.

Não é menos certo que a poupança excessiva tem - paradoxalmente - um efeito negativo na economia por ser propiciadora de uma retracção no consumo que tem como resultado uma redução do investimento que gera, por seu turno, mais desemprego, ou seja, menos dinheiro disponível e ainda menos consumo.

Se desta crise resultar uma percepção geral de que é essencial uma gestão equilibrada dos rendimentos entre aquilo que é necessário ao bem estar de cada um e aquilo que é puramente acessório, a Sociedade estará certamente mais bem preparada para o que ainda há-de vir e para uma eventual nova crise futura, fazendo jus à afirmação que não é possível viver eternamente "acima das possibilidades de cada um".

Numa segunda perspectiva de factores positivos, entendo que a interiorização da noção de empreendedorismo é igualmente merecedor de um destaque, porque dela resultam em si mesmo duas consequências também elas positivas.

Por um lado a crise e, sobretudo, as situações de desemprego, tendem a motivar as pessoas a encarar o seu próprio futuro como algo que poderá passar por cada um de nós, "abraçando" projectos empresariais próprios que permitirão - assim se espera - obter resultados positivos para o seu autor mas que não deixarão de ser igualmente relevantes para a Sociedade na medida em que o sucesso de um tal projecto acarreta necessariamente mais-valias ao nível da disponibilização de novos produtos ou serviços, mas igualmente na potencial criação de mais emprego, ainda que admita que nem sempre estas iniciativas individuais estarão adequadamente assentes em bases suficientemente fortes (estudos de mercado, etc) para uma subsistência duradoura.

Por outro lado e "olhando" para as empresas, esta noção de empreendedorismo tem levado muitas empresas a reconhecer as limitações do mercado português e, consequência de tal facto, a abrirem as suas "portas" a outros mercados - não necessariamente o Europeu - sendo o crescimento sustentado das exportações uma flagrante demonstração desta mudança de atitude por parte dos empresários, a qual só poderá ter alguma perspectiva de sucesso se fundada num conhecimento profundo desses "novos" mercados e sobretudo uma consciência de que tal não tem, quase nunca, como consequência o lucro imediato.

Fixando as perspectivas positivas dos "tempos de crise" e com a ressalva inicial de não pretender encerrar este elenco sem admitir que outras mais haverá, interessa-me relevar o renascer de uma atitude activa por parte das populações no sentido de reconquistar uma auto-consciência de que há ideais pelos quais merece sempre a pena  lutar.

Seja pela forma das curiosas "Grandoladas" ou de uma maior intervenção cívica em debates públicos o que importa é cada um de nós "perceber" que o nosso próprio bem-estar futuro depende exclusivamente das nossas opções mas também de uma capacidade de interiorizar um maior sentido critico, de exigência mas igualmente de reforço da cidadania para que esse desiderato possa ser alcançado, desde logo numa maior e mais consciente participação nos actos eleitorais, independentemente da escolha que cada um.

É que o ditado a que me refiro inicialmente não termina por ali pois, por alguma razão, a sabedoria popular entendeu dar-lhe continuação ao dizer que também não há "bem que nunca acabe". É fundamental que tenhamos consciência plena disso mesmo. Assim vão as cousas.      

domingo, 12 de janeiro de 2014

O meu melhor

Quando (embora em momento indefinido) parte daquilo que para cada um de nós é um dado adquirido surgiu pela primeira vez ficou para sempre definido que não haveria conceito algum que não admitisse o seu oposto, podendo essa presunção ser entendida como a prova de que ambos são, dessa forma, admissíveis.

Por isso mesmo, é razoável admitir que o significado da palavra "sim" só fará sentido porque, pelo contrário, existe o "não" ou que o conceito de "dia" é que se conhece porque reconhecemos a "noite" e, terminando os singelos exemplos do que se pretende afirmar, também aquilo que é para uns "negativo" tem a sua antítese naquilo que para outros é "positivo".

Dessa forma e porque tive ocasião de enunciar anteriormente os factos que, a meu ver, constituíram aquilo que de pior pude registar - numa percepção estritamente pessoal - no ano transacto chegou agora a altura de dar significado à introdução da presente dissertação e fazer igual "exercício" relativamente aos factos e às pessoas que se destacaram nesse mesmo período, seguindo uma vez mais um escalonamento consoante o grau de importância.

10. Miguel Macedo

Durante o período dos fogos foi o único membro do governo que deu permanentemente "a cara" perante a catástrofe nacional que se ia constatando diariamente aos olhos dos portugueses. Até mesmo a Presidência da República terá optado por se "refugiar" numa estranha discrição que "caiu mal" na opinião pública "obrigando" a um posterior reconhecimento público da gravidade da situação. Não estava em causa a presunção de que por detrás dessas palavras houvesse uma forma de populismo mas o reconhecimento de que - em momentos como estes - por vezes a palavra é tudo e o ministro Miguel Macedo soube interpreta-lo correctamente.   

9. Django Libertado

Um grande filme de um cineasta que consegue, como ninguém, criar um estilo próprio que nunca se repete. Transforma a violência em comédia pelo recurso a um evidente exagero na forma como filma essa mesma violência. Mas o melhor continuam a ser os diálogos e a forma como consegue colocar qualquer actor - conhecido ou desconhecido - a "dar corpo" a interpretações memoráveis, com ou sem direito a Óscar. 

8. Empreendedorismo

Expressão que, pessoalmente, me é bastante cara, é porventura um dos reflexos mais positivos dos tempos actuais de crise, da qual resulta uma aposta numa outra dimensão da forma de cada um ver e analisar o seu próprio futuro e criar as condições necessárias de bem-estar (nas diferentes acepções da palavra). Tudo começa, afinal de contas, com uma predisposição para a mudança, seja numa perspectiva pessoal seja na óptica de ajudar os outros a caminhar para essa mudança. 

7. Rui Moreira

Num ápice o actual "inquilino" da segunda maior câmara municipal de país "conseguiu" dois feitos assinaláveis. Em primeiro lugar mostrou a força dos denominados movimentos independentes, ainda que no seu caso fosse indisfarçável o apoio do CDS e do próprio antecessor na câmara. Em segundo lugar "atirou" o "mais-do-que-provável" vencedor das eleições para um embaraçante terceiro lugar, impedindo que o Porto ficasse à mercê dos desvarios populistas de Luís Filipe Meneses. Após as eleições e sem maioria absoluta conseguiu aquilo que parece impossível a nível nacional: uma coligação com o segundo partido mais votado para governar em estabilidade.

6. Exportações

O "motor" mais visível de um dos pilares de uma possível recuperação económica ou, pelo menos, a causa para que os resultados das politicas de austeridade não tivessem sido ainda mais devastadoras. Portugal é, por assim dizer, uma "marca" vendável e a percepção de que o mundo é um mercado global parece ter sido, finalmente, entendido pelos empresários. A interiorização da necessidade de especialização e de aposta na qualidade é fundamental para a diferenciação perante outros competidores, e parece estar a ser conseguido. 

5. Desporto Nacional

Seria relativamente fácil restringir este conceito a Cristiano Ronaldo, porventura o "símbolo" mais reconhecido e reconhecível em todo o Mundo de um atleta de excelência português. É justo, contudo, salientar que nesse aspecto outros houve que foram notícia pela positiva, como foi o caso do ciclista Rui Costa, do tenista João Sousa ou do ultra-maratonista Carlos Sá, entre outros, "lembraram" os portugueses de que desporto não é apenas futebol e que, ao contrário do "desporto-rei", para se chegar a um tamanho patamar de notariedade há quase sempre mais obstáculos a vencer do que os da própria modalidade, desde logo a indiferença. 

4. Exposições

O ano começou com uma excelente exposição no CAM sobre a obra de Amadeo Sousa Cardoso e termina com uma exposição no Museu Nacional de Arte Antiga com obras provenientes de um dos melhores museus do mundo, o Museu do Prado. Pelo meio milhares de pessoas tiveram igualmente a possibilidade de conhecer a Encomenda Prodigiosa no Museu de São Roque e no Museu Nacional de Arte Antiga e aderir em massa à exposição de Joana Vasconcelos no Palácio Nacional da Ajuda. Num país com um crescente desinvestimento na Cultura a "persistência" numa oferta rica e variada de eventos culturalmente relevantes é fundamental para contrariar o risco de um país "sem memória".

3. Papa Francisco

Não creio que se distinga dos seus antecessores por transmitir uma mensagem de modernidade ou sequer de rotura na igreja. Distingue-se dos anteriores pela sua simplicidade de proximidade com os fieis. E as pessoas parecem gostar por se reverem em alguém que, apesar do cargo que ocupa, não será afinal tão diferente deles. Tem conquistado tudo e todos pela sua simpatia e, reflexo disso mesmo, a Praça do Vaticano voltou a encher-se de gente para o ouvir. A espontaneidade de cada um dos seus gestos é a todo o momento "notícia". Infelizmente, tendo em conta a sua idade, poderá ter chegado demasiado tarde à Cadeira de São Pedro ou, numa outra perspectiva, poderá ter afinal chegado no momento certo.

2. Nelson Mandela

A morte de alguém é, quase sempre, associado a algo de negativo. Neste caso, contudo, entendo que o desaparecimento deste grande Ser Humano constituiu um grande momento para a humanidade porque permitiu - de forma quase unânime - uma reflexão sobre a sua vida mas, sobretudo, sobre as suas causas. Numa altura em que parecem existir novas sombras sobre a importância de lutar por ideais de liberdade e democracia, Nelson Mandela lembrou-nos que, independentemente das dificuldades e das adversidades, é fundamental lutar pelas causas que merecem verdadeiramente a pena, isto é, aquelas que resultam em beneficio do bem comum.  

1. Tribunal Constitucional

Deixo para o fim e, afinal de contas, para o lugar de maior destaque, a figura de um Órgão de Soberania, independente dos demais, mas com uma função primordial que o destaca dos restantes: zelar pelo exercício regular das funções dos Estado e pela defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos. Para tal analisa as leis que lhe são submetidas à luz dos princípios constantes do documento fundamental de um Estado Democrático: a sua Constituição. Nunca na história contemporânea de Portugal o Tribunal Constitucional terá sido sujeito a tantas criticas e pressões para que, no fundo, deixasse de cumprir as funções para que está destinado em função dos tempos actuais de crise. Pois, bem pelo contrário, são precisamente estes os tempos em que é necessário uma maior "vigilância" do cumprimento de princípios fundamentais, e essa é a maior garantia que os cidadãos podem ter.  

Presumo que seja desta forma que todos aqueles que gostam de reflectir sobre o que de pior e de melhor se passou no ano anterior o fazem. Seja ou não por desta forma, importante mesmo continua a ser o exercício de reflexão que lhe está subjacente. Da minha parte - goste-se ou não - continuarei certamente a fazê-lo, a bem da minha própria consciência. Assim vão as cousas.
   

domingo, 5 de janeiro de 2014

O meu pior

Registo uma certa "moda" de, no inicio de cada novo ano, fazer-se uma espécie de resumo analítico do melhor e do pior do ano imediatamente anterior, algo que desperta em mim alguma curiosidade para permitir a mim próprio uma retrospectiva desse mesmo ano independentemente de concordar ou não com as "escolhas" de cada um ou da sua relevância.

Contudo e apesar da referida curiosidade, nunca dei por mim a efectuar um tal "exercício" pelo que, admitindo que o mesmo resulte necessariamente de uma forma de estar associada à nossa própria maneira de reflectir sobre os principais temas da nossa Sociedade e do Mundo em que vivemos, entendo ser chegada a hora de seleccionar pela positiva e pela negativa as minhas personalidades e factos do ano transacto.

Desta forma começarei pelas escolhas do lado negativo, numa espécie de "campeonato" que não terá mais de 10 "participantes" e que, como em qualquer competição, será também aqui escalonado do menos mau para o pior.

10. António Costa

Independentemente da vitória expressiva em Lisboa a sua proeminente figura de "salvador da pátria" dentro do PS encarna aquilo que, pessoalmente, mais me incomoda na política, isto é, alguém que parece fazer sempre "sombra" ao líder do seu próprio partido sem contudo assumir "oficialmente" essa posição, fazendo as "delicias" dos órgãos de comunicação e do próprio Governo através de uma presença mediática constante e por meio de afirmações que tudo parecem sugerir mas nada afirmar.     

9. Poiares Maduro

Este seria, caso não tivesse havido remodelação governamental no inicio do ano, o lugar destinado ao ex-ministro Miguel Relvas. Creio, contudo, que aquilo que sobrava a Miguel Relvas em termos de protagonismo, falta em absoluto a Poiares Maduro, a quem, logo que foi anunciada a sua nomeação para o cargo, não faltaram elogios devido ao seu currículo académico ao qual, pelo que se tem visto, não corresponde qualquer efeito prático, tão evidente é a ausência de factos que permitam - em consciência - perceber qual é, de facto, o seu papel no Governo, excepção feita a uma tentativa falhada de desempenhar uma espécie de "ministro da propaganda" através dos "célebres" "Briefings do Governo", que haveriam de terminar tão rapidamente como começaram por "ordem superior", tão evidente era a incompetência para a função.

8. Mário Soares

Sendo um apreciador do seu percurso político e da importância fulcral da sua acção no movimento democrático que haveria de libertar Portugal de um regime ditatorial com 48 anos, não me revejo na progressiva banalização e radicalização das suas intervenções públicas que, numa certa perspectiva poderiam ser louváveis por traduzirem uma necessidade pessoal de manter até ao fim da sua vida uma luta firme pelos seus ideais e convicções mas que, no essencial, têm sobretudo aproveitado aos seus opositores para "alimentar" uma campanha contra si e contra o seu papel na história contemporânea de Portugal que seria dispensável. Porventura o afastamento mediático dos últimos tempos poderá corresponder a algo que eu próprio sugeri numa dissertação anterior. E se assim for, ainda bem.

7. Extrema Direita na Europa

Diz-se, e provavelmente com razão, que o tempo tudo apaga, mas tal não pode ser a razão para que na Europa se esteja a viver um período absolutamente preocupante de ressurgimento de sentimentos xenófobos e anti-europeístas que começam - ironicamente - a ganhar força e expressão eleitoral em determinados países mais afectados no passado a esse mesmo discurso radical, ameaçando a estabilidade nesses mesmos países mas também na própria Europa, algo a que não é indiferente os efeitos da crise, normalmente o território de eleição para estes movimentos semearem as suas bases de apoio, perante uma aparente indiferença geral. O tempo não pode apagar a memória.

6. Nuno Crato

Provavelmente um dos piores ministros da educação da história de Portugal. "Conseguiu" o feito singular de destruir o trabalho da Dra. Maria de Lurdes Rodrigues, por mera opção ideológica, sem nunca manifestar qualquer sinal de dispor de uma verdadeira política para o ensino em Portugal. Por isso mesmo apelidei-o de "ministro avulso" por, insistentemente, anunciar medidas avulsas quase sempre elas próprias substituídas na semana seguinte. Detestado uniformemente por alunos, professores, pais, reitores e, claro está, pelos sindicatos, não se percebe ao certo afinal para quem governa este ministro.

5. José Sócrates

No ano do retorno à ribalta mediática optou por fazê-lo através de uma rubrica de opinião semanal onde, tal como era previsível, se "entretém" a destilar a sua oposição a quem o substituiu no Governo e a procurar "limpar" a sua própria imagem e do seu Governo. Odiado por muitos mas também (ainda) apoiado por muitos no seu próprio partido, não estou certo que este regresso e, sobretudo a forma escolhida, sejam o mecanismo adequado ao efeito pretendido, provavelmente ditado pela necessidade de se "defender" de uma convicção que foi sendo disseminada pelo actual governo de que seria ele próprio a encarnação de todos os males de Portugal, algo que o seu próprio partido não procurou ou não soube - porventura por conveniência - desmistificar.

4. Síria

O exemplo acabado da incapacidade internacional de lidar com um problema que a cada dia que passa vai causando mais mortes e desalojados. Segundo consta já terão morrido mais de 130.000 pessoas desde o inicio do conflito. Contudo apenas quando se constatou que uma pequena parcela dessas mortes teria resultado do uso de armas de destruição massiva é que a Comunidade Internacional pareceu reagir, numa espécie de "ética da morte" em que numa guerra não é indiferente a forma como se morre. De resto aquilo que se assiste é ao bloqueio das Nações Unidas por interesses divergentes que o comum dos mortais - mas sobretudo os próprios sírios - terão dificuldade em entender, como difícil de entender será quem são afinal os "os bons e os maus da fita" neste conflito.

3. Fogos florestais

Numa espécie de tradição sem patrono o país "assistiu" uma vez mais à devastação da sua área florestal desta vez com o lamentável acréscimo de mortes entre os bombeiros. Como sempre acontece em Portugal o assunto vai-se resolvendo pela sucessão das estações que fazem cessar os fogos mas tal como também sempre se verifica os tempos que se seguem são mais de apurar responsabilidades - pelos fogos e pelas mortes - do que "atacar" convenientemente o problema no seu tempo devido, isto é, nas estações menos expostas ao calor. Como esta "lógica" tende a imperar é expectável que neste novo ano a história se repita até que um dia esse mesmo problema deixe de existir simplesmente porque nada mais há para arder.

2. Paulo Portas

Juntou ao seu "famoso" populismo a ideia de alguém quem não consegue ele próprio lidar com a sua própria maneira de estar em política. Não está em causa sequer as "piruetas" que tem efectuado para gerir a evidente contradição entre tudo aquilo que afirmava na oposição em defesa dos reformados e dos mais pobres em geral. O que se ficou a saber é que a força das suas próprias palavras têm uma reduzida validade e que a sua "irredutibilidade" e as suas "linhas vermelhas" têm o valor que o próprio lhes quiser dar, em função da sua própria ambição. Colocou o seu partido no chamado "arco da governação" e de lá parece não querer sair nem que para isso tenha de anular as suas convicções. 

1. Cavaco Silva

Acabou o ano como começou. Um discurso inútil, pleno de auto-elogio e de afirmações de uma convicção pessoal de que a razão estará do seu lado e de mais ninguém. Continua a fazer a gestão da sua própria imagem para futuro eliminando qualquer associação à situação presente mas, sobretudo, ao seu próprio passado. Talvez por isso mesmo qualquer nova comunicação ao país é necessariamente seguida de um esclarecimento da sua "casa civil" que procurará esclarecer aquilo que supostamente deveria ter sido claro anteriormente. Continua a falar em "consensos" como se não fosse ele próprio uma das razões para essa mesma falta de consenso. Ficará para a história como o pior Presidente da 3ª República em Portugal.

Recordar o que pior se passou num ano e as figuras que o marcaram causam-me uma sensação de desgaste que procurarei "compensar" na próxima semana quando, nessa ocasião, efectuar o "desfile" das coisas boas que se passaram nesse mesmo ano. Assim vão as cousas.



quinta-feira, 2 de janeiro de 2014