Quando rebentou a crise de 2009 os Estados, nomeadamente os integrantes da UE, norteavam as suas politicas numa lógica de consolidação orçamental e controlo da despesa pública (ainda que alguns de forma meramente aparente) em linha com as disposições dos tratados que regem as relações entre os diversos estados-membros.
Quer isto dizer que se seguia uma politica comum de redução do défice das contas pública, controlo da inflacção e manutenção de elevados niveis de emprego.
Para que tal tenha sido possivel os diversos Estados empreenderam medidas de rigor e, não raras vezes, com sacrificio das respectivas populações, na medida em que houve necessidade de recorrer ao agravamento da politica fiscal, isto é, com recurso a aumento de impostos.
A grande verdade é que se as regras dos tratados são iguais para todos, nem todos os Estados são iguais, ou como se costuma dizer "andam à mesma velocidade".
Se alguns países crescem fortemente à custa das suas exportações e da produtividade do seu aparelho económico, com pouca ou nenhuma intervenção estatal, outros há que por não disporem de quaisquer dessas ferramentas (ou por fraca expressão das mesmas) necessitam de uma dose de esforço muito mais acentuado para poderem acompanhar o "passo" dos seus parceiros europeus.
Nos EUA esta questão nem se colocava, uma vez que a figura do Estado central se encontra desde sempre, confinada ao papel de espectador mais ou menos atento, sendo qualquer intervenção na economia desaconselhada e mesmo vista com reprovação.
A grande recessão de 2009 - se me é permitido apelidá-la dessa forma - veio, de forma abrupta, inverter esta lógica.
O Estado, essa entidade supostamente reguladora e vista como má gestora das suas empresas, foi obrigado (literalmente) a intervir de forma séria na economia, mandando às "urtigas" todo o esforço acumulado durante anos, o que em linguagem económica não quer dizer mais do que começar a gastar o que não se tem.
Ficámos a saber que os Estados também podem falir, mesmo os mais ricos, como foi o caso de um dos mais insuspeitos países do mundo, a gélida e vulcânica Islândia.
O sinal evidente de que provavelmente as coisas não poderiam ter sido feitas de outra forma surge, aliás, de onde menos se esperava, isto é, dos EUA.
A Administração Obama para evitar o colapso economico do país foi obrigada a nacionalizar empresas-chave da economia americana para obstar, por exemplo, a que os americanos ficassem sem as suas reformas de um dia para o outro.
Não adianta aprofundar o que se seguiu: defices nunca antes vistos, desemprego galopante, desinvestimento geral, ou seja, instalou-se a desconfiança global.
Mas esta coisa das crises é como os nossos dias, ou seja, tem altos e baixos e tal como depois de uma descida vem necessáriamente uma subida, o ano de 2010 veio desanuviar o ambiente geral.
O problema é que se "acordou" nesta altura para a situação em que alguns países (nomeadamente os europeus) ficaram depois da tempestade, tendo-se desde logo apontado o dedo aos "mau da fita" ou seja aos poderes centrais de cada país, nomeadamente as medidas anteriormente tomadas no combate à crise.
Os diversos Estados foram então confrontados com a obrigação, uma vez mais ao abrigo dos tratados, a retomar o ciclo de crescimento económico, reduzido o défice, etc, etc, tudo já antes visto.
Mas lá voltamos ao mesmo: é que para alguns países será relativamente simples retomar os eixos por via da sua própria actividade económica, para outros, como Portugal, tal dificilmente (ou jamais) será conseguido.
E não o é simplesmente porque nunca assim foi, porque nos habituámos a viver com uma máquina estatal excessivamente "pesada" e com baixos indices de produtividade, o que se reflecte no facto de exportarmos menos do que aquilo que compramos lá fora.
Entendo, contudo, que há duas questões que deveriam (e temo que não o venham a ser) colocadas:
Poderiam os Estados ter actuado de maneira diferente em reacção a uma crise cuja amplitude remetia para o ano de 1929?
Poderão os Estados da UE continuar a procurar convergir numa lógica de "todos diferentes, todos iguais"?
A resposta é, a meu ver, necessáriamente negativa em ambos os casos.
A questão é que uma vez aqui chegados o discurso contra o papel dos Estados na economia se radicalizou, o que só pode significar memória curta ou oportunismo politico. A verdade é que a expressão "neo-liberalismo" passou a constar da ementa de politicos, economistas e daqueles que diáriamente analisam uns e outros.
Em Portugal a figura do dito "neo-liberalismo" aparenta ser o Dr. Pedro Passos Coelho, e para quem tem dúvidas sobre o que representa de facto esta palavra bastará tentar perceber o que resulta da proposta de revisão constitucional que o seu partido publicamente anunciou e o "à vontade" com que aparentemente se dispõe a governar se e quando o FMI nos fizer uma "visita".
Pode ser que me engane, mas este país ainda vai ter saudades das "politicas de direita" do Eng. José Socrates. Assim vão as cousas.