domingo, 27 de janeiro de 2013

Da ética

Durante uma viagem ao Brasil constatei a existência de uma rede significativa de Farmácias, apropriadamente denominadas de Populares que tinham na sua génese a oferta de “medicamentos Éticos e Genéricos de marcas conceituadas com preços acessíveis” (sic).

Em bom rigor tomei pela primeira vez conhecimento de duas realidades associadas ao mundo dos medicamentos que remetiam para a ética e a natureza genérica dos mesmos.

Como é habitual por cá, a temática dos genéricos chegou bem mais tarde do que em boa parte dos países e, sem qualquer surpresa, rodeada de polémica.

Como não seria fácil justificar a referida polémica com base no menor custo médio de qualquer medicamento genérico, centrou-se o debate à volta da “segurança” dos medicamentos genéricos para a saúde pública, uma vez que que os mesmos são receitadas não em função da sua marca, mas em função do respectivo “principio activo” (sic).

Não faltou, nessa altura, que invocasse de forma despudorada a ameaça ao bem-estar comum dos cidadãos, incapazes de discernir de entre a oferta disponível qual aquela que providenciaria a cura para os males de que padeceriam.

Esta “lógica” levou-me de “volta” às terras de Vera Cruz para perceber em que medida é que a banalização dos medicamentos de “marca branca” estariam a contribuir para uma qualquer nova pestilência colectiva.

Sem surpresa constatei que a única repercussão prática associada a esta nova prática seria na redução dos custos com medicamentos suportados pelos respectivos nacionais que, reconhecidamente, vivem em grande parte abaixo do nível de pobreza.

Relativamente a questões de saúde pública parecia, em termos práticos, nada ter afectado o dia-a-dia do cidadão comum, ou seja, não se acentuou de forma alguma a lógica popular de que dessa forma mais depressa de morreria da cura do que do mal.

Talvez por isso mesmo o nosso “pensamento” evoluiu para a aceitação progressiva dos medicamentos genéricos, nomeadamente por parte do próprio Estado, que “percebeu” que dessa forma poderia reduzir - e muito – a sua factura com medicamentos, contrariando a tendência, quase sempre descontrolada, de pagar pela tabela feita à medida daqueles mais tinham a lucrar com o “status quo” vigente, ou seja, os próprios laboratórios, o que nos remete para o segundo conceito associado às ditas Farmácias Populares, a ethos grega.

Esta associação da ética à venda de medicamentos é extremamente curiosa e repleta de significado face ao conceito filosófico subjacente a esta expressão que remete directamente para os valores morais e os princípios que devem nortear a conduta humana na sociedade em que se integra, dos quais deve resultar um equilíbrio social de que ninguém sairá, em principio, prejudicado.

Ora, podendo este modelo variar de sociedade para sociedade e de grupo para grupo (incluindo grupos profissionais) não é, contudo, variável enquanto conceito de justiça social e por isso mesmo a “mensagem” que está subjacente aos fundamentos da rede de farmácias populares é, de acordo com o meu entendimento, que o acesso aos cuidados de saúde é um direito natural que não pode nem deve estar condicionada às “lógicas” meramente economicista e do lucro fácil que no limite impeça ou limite o referido acesso.

Por tudo isto será razoável concluir que, se pode haver dúvidas sobre as consequências para a saúde pública do uso de medicamentos de marca genérica, não subsistem, contudo, quaisquer dúvidas que milhares de pessoas morrem todos os anos por falta de cuidados de saúde ou, por outras palavras, podemos estar em vias de aceitar o principio mas estamos ainda assim muito longe de aderir à ética. Assim vão as cousas.

domingo, 20 de janeiro de 2013

O direito a morrer



A maior potência económica mundial, os EUA, surge, de forma demasiado frequente, no topo da atenção mediática por motivos totalmente à margem desse símbolo de liderança e supremacia sobre a quase totalidade dos estados-soberanos deste planeta.

De facto, em determinados momentos, surge em forma de “notícia de última” hora, o relato de uma nova chacina de inocentes numa qualquer povoação, mais ou menos remota, normalmente associada a uma contabilidade mórbida do número estimado de vítimas, entre as quais se encontra, quase sempre, a do próprio autor do massacre.

As motivações de cada um destes eventos que se vão sucedendo permanece, quase sempre, um mistério insondável, muito propicio a um misto de “imaginação” dos media locais – com amplo eco nos restantes quadrantes – com um perceptível aproveitamento de algumas “personagens” para aparecerem publicamente “à luz” de um presuntivo conhecimento próximo do assassino ou mesmo por parte de parentes mais ou menos próximos das próprias vitimas.

Contudo, se os motivos concretos são alvo de uma multiplicidade de opiniões e possíveis enquadramentos sociais, existe sempre um outro que, aos olhos de quase todo o mundo ocidental, parece uma evidência demasiado visível para poder ser ignorada.

Trata-se do direito constitucionalmente previsto na segunda emenda da Constituição americana que confere o direito de possuir armas.

O que, porventura, poucos o saberão é que este direito remonta ao ano de 1791, enquanto parte integrante da denominada “Bill of Rights”, isto é, ao período da revolução e independência americana, num contexto substancialmente e necessariamente diferente ao actual.

A verdade é que, como qualquer preceito constitucional que se prese, este mesmo direito manteve-se basicamente inalterado ao longo dos séculos, apesar dos tempos serem manifestamente outros.

Em termos práticos, o que esta lei de valor reforçado confere a qualquer cidadão americano é o direito de possuir qualquer arma sem uma noção clara de quaisquer restrições entre a noção de faze-lo na perspectiva da pura defesa pessoal ou por motivos associados à prática da caça ou pura e simplesmente para constituição de verdadeiros arsenais militares “caseiros”.

O resultado desta “equação” é um verdadeiro desajustamento entre o espírito da lei e a realidade prática que se vive nos EUA, na medida em que, sendo evidente que jamais alguma lei soberana confere a alguém o direito a tirar a vida a outro ser humano (excepto em "honrosas" situações), o que se verifica é que todas as situações vividas pelos americanos de há largos anos para cá resultam, única e exclusivamente, da utilização indevida do armamento que, quase sem restrições, qualquer um pode adquirir.

Por isso mesmo, a ocorrência de verdadeiros massacres em território americano tornou-se uma quase banalidade, ou seja, são sempre novos eventos que se somam a muitos outros anteriores os quais, diga-se, não enfermam sequer de motivações raciais ou religiosas, mas quase sempre de distúrbios pessoais de quem os pratica.

A questão fundamental é tentar perceber o motivo pelo qual uma tal lei se mantém inalterada apesar de se encontrar descontextualizada do momento em que foi criada e não obstante as consequências reais insustentáveis em qualquer país (dito civilizado).

É aqui que entra a minha perspectiva pessoal de que essa imutabilidade se deve ao interesse económico que esta a actividade – a indústria do armamento – tem em qualquer local, mas especialmente nos EUA, e o poder de influência (lobby) que foi adquirindo ao longo dos anos, tornando-o inquestionável.

Esta minha percepção resulta do facto de não encontrar paralelo deste tipo de legislação em nenhum outro Estado ou, ainda que possa existir um sistema mais flexível relativamente à posse de armas, não se detectar uma tão evidente constância de actos de assinalável barbárie.

Por outro lado, a reacção que habitualmente se segue a qualquer novo evento é uma espécie de uniformidade de opiniões que literalmente “atiram” qualquer possível discussão sobre este tema para uma altura em que a mesma possa não estar condicionada por qualquer evento concreto, discussão que invariavelmente nunca chega a ocorrer.

O paradigma americano é, contudo, bastante evidente, pois é este mesmo povo que vive num quase permanente estado de medo de possíveis atentados externos, bem visível nos cuidados que, ainda hoje, é possível constatar, por exemplo, quando se pretende viajar de avião.

Infelizmente para todos os inocentes (muitas delas crianças e jovens) que morrem às mãos de pessoas de evidente menoridade intelectual, não parece haver grande perspectiva futura de poderem ser os últimos de uma extensa lista, que inclui normalmente o próprio autor dos crimes que, quase sempre, “escapa” à justiça dos homens pondo termo à própria vida ou sendo abatido pelas forças de autoridade.

Creio também que tal se verificará pela convicção – certamente não assumida – de que no momento em que alguém colocar em causa este estranho direito, torna-se um potencial alvo das investidas daqueles a quem interessa manter o “status quo” actual. Mesmo que esse alguém seja o próprio Presidente. Assim vão as cousas.

domingo, 13 de janeiro de 2013

A "corrida insólita"


O Orçamento de Estado para 2013 corre o “risco” de se tornar um dos maiores casos de estudo da história das finanças públicas portuguesa, fazendo as “delícias” dos historiadores e dos estudiosos da nobre disciplina da Ciência Política.

No entanto, tal percepção não resulta da convicção de que esse mesmo “risco” tenha na sua génese uma qualquer causa e efeito de natureza positiva.

O “nascimento” deste Orçamento anunciou, desde logo, uma previsível reacção em cadeia por parte dos diversos agentes políticos, organizações sindicais, destacados elementos da sociedade civil e mesmo de altos responsáveis da Igreja.

Em causa estaria a natureza das medidas orçamentais que iam sendo progressivamente anunciadas, as quais promoviam uma vez mais um acentuado aumento dos impostos ou, nas palavras do próprio Ministro das Finanças, um “enorme aumento de impostos”.

Ora, a incidência específica do reforço da carga fiscal dos contribuintes era especialmente relevante em três matérias distintas, embora necessariamente interligadas relativamente ao fim que se pretenderia seguir com as mesmas.

Tais matérias remetiam para as alterações dos escalões do IRS, a suspensão dos subsídios de férias dos funcionários públicos e dos reformados e a contribuição extraordinária de solidariedade para os pensionistas.

A questão que sempre se colocou foi a da conformidade dessas matérias com a lei fundamental do Estado, isto é, a Constituição da República e, nessa ocasião, não faltou quem alertasse para o facto dessa mesma conformidade não existir, remetendo parte da Lei Orçamental para a inconstitucionalidade.

Indiferente a tais “avisos” a maioria parlamentar que apoia o Governo aprovou, por fim, o Orçamento de Estado no qual se encontram consagrados os articulados de natureza controversa atrás referidos, tendo o foco mediático sido direccionado para o “inquilino” do Palácio de Belém que, à luz dos seus legítimos poderes constitucionais, deveria decidir sobre o destino do documento agora nas suas mãos.

De uma forma mais ou menos consensual foi então referido que a promulgação do Orçamento deveria ser precedida de um pedido de fiscalização preventiva das eventuais inconstitucionalidades, de forma a impedir a entrada em vigor do documento “ferido” de ilegalidade em algumas das suas normas, caso tal viesse a ser julgado dessa forma.

Assim não o entendeu o Presidente da República que, não obstante ter apresentado um justificativo público “carregado” de dúvidas e de uma indisfarçável crítica à Lei Orçamental que havia acabado de aprovar, entendeu apenas submeter a avaliação das eventuais ilegalidades após a entrada em vigor do Diploma que, dessa forma, passaria a produzir efeitos na data prevista, isto é, no primeiro dia do ano.

Acontece que, em paralelo com a iniciativa de suscitar a fiscalização sucessiva da constitucionalidade de algumas das normas, outros “actores” da “animada” vida politica portuguesa entenderam também fazê lo, seja relativamente às mesmas normas objecto do pedido por parte da Presidência seja em relação às demais cuja controvérsia se anunciava desde que foram conhecidas.

Temos pois, num dado momento histórico, uma situação ímpar de uma confluência de pedidos de fiscalização da constitucionalidade do Orçamento de Estado, facto que levou o Dr. Pedro Santana Lopes a falar em “corrida insólita”, expressão que tomo a liberdade de utilizar como título para a presente dissertação.

Em simultâneo constata-se o avolumar de um conjunto de opiniões de parte a parte, facilmente confundíveis com um misto de pressão e chantagem sobre os juízes do Constitucional mas igualmente sobre a própria opinião pública, incapaz de discernir sobre as consequências práticas de um tema que as afecta directa e profundamente.

Desconhecendo à data desta dissertação qual será a decisão do Tribunal Constitucional e as consequências daí emergentes caso a mesma seja em sentido negativo às pretensões do Governo questiono-me, contudo, sobre um certo debate que vai tomando forma a partir do qual algumas pessoas defendem – nomeadamente o Governo – que a situação de “emergência” do país justifica uma espécie de estado de excepção que permitiria, no limite, que o Orçamento seja executado independentemente da existência de normas inconstitucionais no seu articulado.

Esta questão é, a meu ver, da maior relevância prática e não pode nem deve ser colocada neste plano.

Um tal posicionamento não pode ter outra interpretação que não seja de entender como aceitável que em tempos “extraordinários” o Estado poderá “viver” na ilegalidade.

O “problema” deste entendimento, se aceite, é que a existência de uma ilegalidade formal da Lei Orçamental cria, ela própria, uma situação de natureza “extraordinária” de valor necessariamente reforçado em relação àquela que a justificaria.

Admitindo este principio, quem passaria a definir em termos futuros o limite até ao qual seria admissível e aceitável a vigência de diplomas contrários à Constituição? Correr-se-ia, dessa forma, o risco de tornar um qualquer regime de excepção na própria regra, bastando para o efeito que fossem invocados sucessivamente os mesmos motivos que justificam essa excepção.

Importa recordar que as dúvidas agora levantadas por diversos quadrantes não são novas e sucedem-se ao que se verificou a propósito do Orçamento de Estado para 2012, momento em que este órgão de soberania decretou a inconstitucionalidade das normas para as quais havia sido chamado a pronunciar-se.

Por aqui se vê e conclui que a reconhecida situação de emergência do país não pode ser contornada com o recurso a legislação que não seja conforme à Constituição mas, bem pelo contrário, é essa mesma emergência que deverá – ou deveria – levar a um especial cuidado na elaboração de documentos como o Orçamento.

É que, se no passado a decisão do Tribunal Constitucional se baseou na violação do Principio da Igualdade, as duvidas que agora se colocam é se não estarão em causa normas que violam para além desse mesmo principio também o Principio da Proporcionalidade, ou seja princípios fundamentais de qualquer Estado de Direito que não estão - certamente - ao dispor de qualquer Governo nem podem ser arbitrariamente suspensos em função da convicção da existência de uma situação de emergência. Assim vão as cousas.

domingo, 6 de janeiro de 2013

Choque frontal


A actual crise em que “vivemos” trouxe à evidência de todos um conjunto de realidades para as quais a nossa percepção – ou focalização – não se encontrava manifestamente desperta.

É como acordar repentinamente de um estado de inconsciência dormente em que boa parte de nós se encontrava e para a qual manifestamente não estávamos preparados e, consequentemente, em condições de a ela responder.

Não me refiro, contudo, à situação das contas públicas, o problema do financiamento do Estado, ou mesmo da fragilidade do sector bancário perante a elevada exposição à divida pública de alguns Estados em situação de iminente insolvência ou a ameaça, mais ou menos real, de uma saída da zona Euro.

Tudo isso, sendo igualmente parte da realidade que encima a presente dissertação, foi anteriormente objecto de uma exteriorização da minha convicção pessoal sobre a mesma, pelo que, desta feita, interessa-me em particular, abordar a vertente do impacto que a crise tem tido nos nossos hábitos de consumo.

E, muito em concreto, nos sectores da habitação, na restauração e na aquisição de determinados produtos.

O chamado “boom” da construção levou ao crescimento desenfreado de novas construções um pouco por todo o lado, situação da qual não resultava sequer uma redução dos preços por via de uma perspectiva de concorrência que, em termos práticos, não se verificava.

E não se verificava porque o suporte necessário para esse mesmo crescimento assentava na total disponibilidade por parte dos bancos para financiar a totalidade do investimento, por prazos quase superiores à esperança média de vida, com um custo de capital práticamente nulo, fruto de uma conjugação quase perfeita de juros baixos com “spreads” igualmente baixos e, não menos importante, com uma reduzida exigência relativamente às garantias (pessoais) da capacidade de cumprimento das condições do empréstimo.

Com tal conjuntura, fosse qual fosse o preço do imóvel, havia uma disponibilidade quase total das partes interessadas no negócio em facilitar a sua conclusão.

Na restauração a questão colocou-se num duplo plano, isto é, por um lado a constatação dos hábitos de consumo dos portugueses que de certa forma “abandonaram” o conceito de refeição nos respectivos lares (incluindo as refeições mais “ligeiras”) passando a frequentar com uma preocupante assiduidade cafés, restaurantes e similares, sem perspectivar o impacto daí resultante para a chamada economia familiar.

Por outro lado, verificou-se o crescimento exponencial dos denominados empresários da restauração que, quais cogumelos, abriam novos estabelecimentos em cada rua e em cada esquina, grande parte deles sem a mínima noção do conceito inerente à gestão deste tipo de locais.

Por último e sem querer desta forma afirmar que a possível lista de “vítimas” da crise fica desta forma concluída, verifico com particular atenção o que se passa com o sector automóvel e de bens de consumo como as televisões, telefones ou outros de natureza conexa.

E Portugal, neste capítulo específico, é um autêntico “case study”.

De facto, a transição entre um país que dispunha de um dos mais velhos parques automóvel da Europa para uma situação que se tornou de certa forma fácil encontrar em cada local o último modelo de cada marca (e normalmente o mais potente) foi feita, para não fugir ao tema, a "grande velocidade".

Este mesmo “fenómeno” verificou-se igualmente ao nível de outros bens em que qualquer aparelho recentemente adquirido rapidamente soçobrava perante o seu mais recente “upgrade” ou nova versão, sem que grande parte das pessoas – conscientemente – chegasse a disfrutar do anterior ou sequer percebesse em que é que o mais recente era efectivamente diferente (ou uma mais valia) relativamente ao anterior.

O resumo de tudo isto é que, fosse na construção, na restauração ou na compra de bens, a “fúria” consumista dos portugueses parecia incontrolável e insaciável.

Veja-se, contudo, qual o cenário com que nos confrontamos hoje.

Na habitação deixou práticamente de se construir porque não há ninguém para comprar na medida em que os bancos deixaram de emprestar dinheiro ou porque o mesmo é agora mais caro do que nunca ou dependente de garantias reais e pessoais que as pessoas não estão em condições de prestar.

O resultado? Falência em massa de empresas de construção, desemprego crescente no sector e acentuada incapacidade de cumprimento dos empréstimos por parte de quem os tinha contraído sem condições para tal ou sem perspectivar uma possível mudança do “clima” económico.

Na restauração verificou-se uma progressiva desertificação dos espaços, fruto do “regresso” a casa por parte das pessoas, que aí passaram a fazer as respectivas refeições (quase todas elas) ou, quando tal não era possível, levando para os seus próprios locais de trabalho as suas lancheiras, situação que, associada à subida da taxa de IVA, apenas veio trazer à “luz do dia” uma oferta excessiva e quase sempre indiferenciada.

O resultado? Encerramento sistemático de restaurantes e cafés e aumento do nível de desemprego no sector, sendo que parte significativa da respectiva mão-de-obra era assegurada por indivíduos de nacionalidade estrangeira, com as possíveis consequências sociais daí emergentes.

Por fim, constata-se a redução drástica da aquisição de bens - agora considerados como não essenciais -  os quais parecem voltar a ganhar uma “esperança de vida” muito próxima da que tinham antigamente, o que de facto nunca deixou de suceder apenas as pessoas tinham “deixado” de querer perceber isso mesmo.

O resultado? Forte retracção no consumo das famílias, da qual resulta uma diminuição dos resultados das empresas, cuja consequência principal é a deslocalização (ou encerramento) das mesmas e consequente aumento do número de desempregados.

Seja por onde for, a natureza e a consequência do problema são, como é fácil constatar, absolutamente coincidentes, tendo como resultado prático a explicação de parte (nada despicienda) do momento em que nos encontramos.

Nestas alturas é, porém, costume dizer-se que com as crises surgem igualmente as oportunidades e, neste capítulo, entendo que a oportunidade que se pode e deve extrair do ponto de vista das empresas é aquela que decorre do próprio reajustamento da oferta (e da própria qualidade dessa mesma oferta), que passará tendencialmente a situar-se a um nível adequado ao da procura.

Na perspectiva das famílias ou da economia familiar, conforme a nomenclatura preferida de cada um, a oportunidade que poderá advir do panorama actual é o de potenciar em cada um de nós a necessidade de uma gestão equilibrada das finanças pessoais, pensando cada vez mais numa perspectiva de médio-longo prazo, assimilando dessa forma uma palavra que se encontrava “arredada” do vocabulário geral, isto é, a necessidade de poupar.

Para aqueles que ainda o consigam fazer, claro. Assim vão as cousas.