domingo, 31 de dezembro de 2017

Mensagem


"As pessoas hão-de esquecer-se do que disse. As pessoas hão-de esquecer-se do que fez. Mas as pessoas nunca hão-de esquecer-se de como as fez sentir-se" (Maya Angelou)

Inspiro-me no poeta para todos aqueles que me lerem, qual mensagem Urbi et Orbi, que é possível afinal considerar que afirmar algo e o seu preciso contrário são, afinal de contas, elementos compatíveis desde que devidamente fundamentados.

Por isso mesmo não hesito em considerar que o ano de 2017 foi simultaneamente o pior ano da minha vida mas também o melhor da mesma, excluindo claro está aqueles momentos que associamos ao nascimento ou morte de alguém próximo por se encontrarem num patamar de experiências de vida que não são enquadráveis num conceito de bom ou mau, por estarem além e aquém desse mesmo conceito.

Trata-se, portanto, de enquadrar um momento daqueles que alguns referem não desejar sequer ao pior inimigo - o que não é o meu caso - mas em que esse momento funciona ele próprio como catalisador de algo absolutamente positivo e sem duvida de maior alcance do que o efeito gerador negativo que o motiva.

"Something is rotten in the state of Denmark" (Shakespeare)

Por vezes sentimos que estamos isolados do mundo quando refletimos sobre algo que apenas nós próprios parecemos vislumbrar ou que todos os outros julgam de forma diferente. É como se chegados a um cruzamento a opção a tomar pelo caminho a seguir fosse decisiva, quando uma nos oferece "mais do mesmo" enquanto a outra nos promete sobretudo "dar luta". 

Podemos então escolher levianamente entre a complacência e a resignação ou lutar por aquilo em que se acredita mas que tal nos encaminhe por uma via incerta?

"Concluídos pois todos estes arranjos, não quis retardar mais o pôr em efeito o seu pensamento, estimulando-o a lembrança da falta que estava já fazendo ao mundo a sua tardança, segundo eram os agravos que pensava desfazer, sem-razões que endireitar, injustiças que reprimir, abusos que melhorar, e dívidas que satisfazer" (Dom Quixote)

Podemos sempre ver monstros onde apenas há moinhos de vento, ou ainda uma princesa onde nada há mais do que uma figura que mais depressa se colocaria no papel de vilã fosse esse o cenário na vida real aquele que se passa nos filmes.

Mas ver o que os outros não vêem não é necessariamente sinal de loucura ou de um romantismo exacerbado, é apenas reposicionar uma certa realidade noutro patamar e agir em conformidade com essa mesma realidade, custe o que custar, ainda que se corra o risco de colidir de frente com algo que nos deixará magoados. Mas desistir deixa de ser opção.

"Não é preciso disfarçar-se para se ser salteador, basta escrever como o Dantas! Basta não ter escrúpulos nem morais, nem artísticos, nem humanos! Basta andar com as modas, com as políticas e com as opiniões! Basta usar o tal sorrisinho, basta ser delicado, e usar coco e olhos meigos! Basta ser Judas! Basta ser Dantas! Morra o Dantas, morra! Pim!" (Manifesto anti-Dantas)

Não desejo a morte a ninguém, não só porque os meus instintos humanistas assim o determinam mas também porque é normalmente uma forma "fácil" de resolver qualquer assunto. Não. Nem Tântalo nem Sísifo tiveram essa "sorte", condenados pelos deuses ao suplício de fome e sede eternos, no caso do primeiro, ou a rolar perpetuamente uma pedra morro acima para logo em seguida a mesma rolar morro abaixo e ter de tudo recomeçar a cada novo dia, no caso do segundo.

Que assim seja para quem me quer mal, a quem condeno à mediocridade eterna, a reinar para todo o sempre na corte da hipocrisia, a ser desleal entre iguais. Pim!

"Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu."
(Mensagem, Fernando Pessoa)

Lembro-me de um título de um livro de Lobo Antunes "o que farei quando tudo arde?". Nunca me pareceu tão simples a resposta. Agarrar-me ao que verdadeiramente importa. Aos amigos de quem nunca me esqueço sem pedir nada em troca, mas que sei que nunca me faltarão se deles precisar, à memória daqueles que já não estão entre nós mas de quem me lembro todos os dias, como se afinal nunca tivessem partido.

E, claro, à família. Aquela que, pequena ou grande, nunca nos abandona, mesmo que isso implique decisões difíceis e até mesmo inconcebíveis aos olhos de alguns. Aqueles cujo amor é incondicional.

Tudo isto é hoje tão claro como aquela água que acabou de nascer, tal como como "um homem precisa de se queimar em suas próprias chamas para poder renascer das cinzas!" (Nietzsche).

Caí, queimei-me, renasci e ergui-me novamente. 

Assim foi o ano de 2017!