Temas há
que, seja tarde ou seja cedo o momento em que sobre eles nos debruçamos, mantêm
a respectiva actualidade em virtude do facto de nos “acompanharem” de forma
quase inalterada ao longo dos anos, mas igualmente pela convicção de que assim
se manterão nos tempos mais próximos, inclusive numa perspectiva mais
optimista.
Entre os
referidos temas permito-me destacar o denominado “Processo BPN” relativamente
ao qual não escondo a minha percepção, rotulando a presente dissertação com o
título de um famoso filme de gangsters/mafiosos, por ser esse e não outro o
sentimento que detenho sobre este outro “filme” de gosto manifestamente
duvidoso.
De facto,
o já longo “Processo BPN” é o somatório de uma panóplia de manifestas e
reiteradas acções e omissões de um conjunto significativo de pessoas em que,
até ao momento, aqueles que mais têm sido prejudicados são precisamente aqueles
que se esperava menos o fossem.
Refiro-me
em concreto a todos aqueles que confiaram as suas poupanças a um banco e que,
de um momento para o outro, passaram a integrar o conceito de “lixo tóxico”,
nome pomposo para uma catástrofe que não carece de radiações para causar
vitimas.
Mas
refiro-me igualmente ao conjunto de Contribuintes que se tornaram accionistas
involuntários de um bem sem valor, do qual não só não retiram quaisquer
dividendos como, pelo contrário, terão de suportar pela via dos impostos
durante largos anos.
Tudo
começa, como em qualquer história feliz, por uma “família” cuja prosperidade
invejava a qualquer um, ao ponto de associar a respectiva imagem a uma Selecção
Nacional que, tal como esta família, espalhava o seu brilhantismo na “Europa do
futebol”.
Os
membros de uma tal equipa de sucesso bancário eram, curiosamente ou talvez não
(dependendo do grau de cada um em acreditar mais ou menos em coincidências),
oriundos de uma outra “família”, desta vez de natureza política, unindo
personalidades que, tendo tido no passado funções governativas ou, no mínimo,
parlamentares, gozavam agora nas suas vidas privadas dos benefícios de tamanho
“sacrifício” passado em favor da causa pública.
Sucede,
porém, que como diz o ditado “nem tudo é o que parece” e de um momento para o
outro o “belo edifício” começou a ruir tamanha era a fragilidade das suas
paredes mas, sobretudo, das suas traves mestras, incapazes de resistir a uma
tão grande incapacidade de gestão, algo que aparentemente ninguém – nem mesmo
quem tinha por função faze-lo – parecia conhecer.
Surge
nessa altura o então Ministro das Finanças que, invocando os superiores
interesses da nação, resolve fazer uso de um mecanismo caído quase em desuso
desde os momentos subsequentes ao 25 de Abril de 74 no contexto do então
“Processo Revolucionário em Curso” ditando a nacionalização do banco.
Entendeu
igualmente por bem entregar a gestão dos activos e dos supracitados lixos a
Administração do banco público, concorrente directo do banco agora
nacionalizado, algo que, sabe-se agora, terá gerado um forte conflito de
interesses que “ajudou” a cavar um buraco que, progressivamente, mais do se
alargar ia afundando.
Constatada
a irreversibilidade de dar nova vida a um “nado-morto” o novo Governo que
entretanto havia assumido funções determinou a alienação do que restava do
banco e, num gesto semelhante a quem separa a carne dos ossos, vendeu apenas a
parte “comestível” guardando para si a parte que apenas o cães costumam comer,
certamente porque não lhe dão a restante.
Contudo,
talvez porque a dita carne já seria suficiente para alimentar outra família, a
referida venda foi efectuada a preços que vulgarmente podemos encontrar em
algumas épocas do ano, nomeadamente no comércio a retalho, a que se
convencionou chamar de saldos.
Curiosamente,
o “chefe” do novo dono do banco era ele próprio oriundo da mesma “família”
politica que havia levado o BPN a toda esta situação, deixando também aqui a
cada um dos leitores a decisão de avaliar o maior ou menor grau de coincidência
de toda esta situação.
Pelo meio
de tudo isto o canal privilegiado de supervisão parece ter andado alheado das
suas funções, porventura convicto que as informações que lhe faziam chegar eram
de tal forma correctas que não careceriam de verificação ou, para os amantes
das teorias da conspiração, simplesmente “fechou os olhos” ao que se passava
por mera conveniência.
O
resultado desta omissão foi a politização progressiva de um processo pelo facto
do titular da cadeira do Banco de Portugal nessa altura “pertencer” a uma
personalidade proveniente de outro partido que não o daqueles que haviam gerido
o banco de forma ruinosa, fazendo crer que seria possível que num “assalto a um
banco” (literalmente) o assaltante e o segurança incompetente poderiam ser
colocados no mesmo plano ou eventualmente em que a maior dose de
responsabilidade fosse, apesar de tudo, do próprio segurança.
Embora de
forma tardia, mas não tarde de mais, veio a público uma reportagem de
verdadeiro jornalismo de investigação que “colocou a nu” a dimensão da fraude
e, de certa forma, colocou um “ponto final” na dúvida – se existente – de quem
foi/foram de facto os verdadeiros responsáveis pelo “Processo BPN” sem
esquecer, contudo, todos aqueles que tiveram de forma sucessiva
responsabilidades no agravamento das consequências deste mesmo processo.
Uma
sociedade justa e democrática necessita de esclarecimento que este tipo de
investigação pode proporcionar, na medida inversa em que certamente dispensa um
certo jornalismo que, mais do que investigar, se limita a juntar um conjunto de
peças soltas dando-lhe uma forma final que, ao invés de procurar esclarecer
cria a distorção de uma realidade já de si complexa.
E para
complexidade já basta sabermos agora que este mesmo processo que se iniciou há
já vários anos nos tribunais só terminará para além da própria memória do
mesmo, isto é, se tal chegar, de facto, a suceder. Assim vão as cousas.