domingo, 31 de julho de 2011

Pés de barro

Recentemente e a propósito falecimento em condições trágicas de um jovem actor e cantor deparei-me com uma expressão que era para mim desconhecida até esse momento.

Essa nova expressão referia-se a uma tal de "geração morangos".

Reconhecendo que a mesma remetia para uma série juvenil mas ignorando por completo o que nela se passa dou por mim a pensar que geração poderá ser esta que tem direito a um epíteto.

Não querendo de forma alguma particularizar as circunstâncias em que se verificou a morte a que me refiro na parte inicial desta dissertação parece-me, contudo, oportuno tentar perceber as circunstâncias em que actualmente se atinge a fama.

Existem, em bom rigor, duas formas perfeitamente distintas de se alcançar a fama.

Uma, certamente a mais dificil e trabalhosa, é a que resulta da construção ao longo de uma vida inteira de uma carreira e da correspondente reputação, normalmente não isenta de muito sacrifício, estudo, sofrimento entre muitos outros estados de alma.

Não "nasceram", portanto, de qualquer efeito espontâneo de natureza mediática ou em função de critérios aleatórios não necessariamente ligados a qualquer talento em particular.

Por assim ser não estiveram nem nunca estarão associados a movimentos massificadores de apoiantes, ficando para isso encarregue a História mas também a memória colectiva, de lhes render a devida homenagem.

Nesse aspecto Portugal tem sido ao longo dos anos o paradigma de uma nação que normalmente apenas se associa aos seus mais relevantes membros após a sua morte, embora justamente se deva dizer que tal paradigma tem vindo - e bem - a mudar nos últimos anos.

O que se passa com a "geração morangos" será, pela associação explicita a um programa televisivo, precisamente o contrário, e esta é a segunda forma de atingir a fama.

Nestes casos o estatuto de famoso surge através de uma fulgurante exposição pública e pela "clonagem" a uma determinada personagem ou estereótipo que corresponderá, de certa forma, aos ideiais de uma determinada geração, transcendendo na maior parte dos casos os reais méritos artisticos que lhe deveriam estar subjacentes.

O problema reside precisamente no facto dessa exposição vertiginosa não se encontrar suficientemente sustentada em bases sólidas para poder "sobreviver" a uma eventual substituição por novas "personagens" nas quais a mesma geração ou a seguinte se passam a rever

É precisamente a partir do momento em que isso acontece que normalmente se constata não existir nada mais para mostrar.

A decadência precoce é, na maior parte dos casos, o passo seguinte associado a uma necessidade de dar "sinais de vida" a quem manifestamente já não se interessa por ela.

A velocidade com que se atinge a fama só tem, na maior parte dos casos, paralelo com a velocidade com que se cai no esquecimento.

"Envelhece-se", por assim dizer, demasiado cedo sem que tenham sequer tido tempo para justificar uma fama que se desvanece e sem que algum dia tenham aprendido a saber lidar com ela.

Toda a comoção pública que normalmente se segue ao desaparecimento precoce de algum destes novos "famosos" é também o fruto de uma questão de circunstância e nunca o resultado de uma carreira verdadeiramente sólida e por isso mesmo provavelmente condenada ao elogio efémero.

Esta "geração morangos", posso concluir, vive e sobrevive à custa da mediatização das suas vidas e, espelho fiel disso mesmo, é que também termina com a mediatização das suas mortes. Assim vão as cousas.

domingo, 24 de julho de 2011

Arco da memória

O que é que têm em comum o Cambodja, o Chile, a Argentina e a ex-Jugoslávia apenas para citar alguns países?

Têm em comum o facto de se encontrarem ou terem terminado recentemente o julgamento daqueles que no passado foram responsáveis pelas mais negras páginas das respectivas Histórias.

São países que não se conformaram com a mera transição entre a guerra e a paz ou entre a ditadura e a democracia e trataram de chamar à justiça os seus ditadores e respectivos algozes.

Não estará em causa tanto a dimensão da pena a que serão sujeitos estes indivíduos mas sobretudo a necessidade de criar a consciência que os crimes contra toda uma Sociedade, cuja gravidade nalguns casos é elevada aos denominados crimes contra a Humanidade, não passarão impunes aos olhos dos cidadãos que sofreram directa ou indirectamente os efeitos da repressão movida contra eles no passado.

A simples submissão à lei e à ordem de um ditador ou responsável por crimes é em si mesmo uma condenação de alguém que durante parte da sua vida negou aos outros o direito a um julgamento livre e isento para além de muitas outras privações de direitos fundamentais, desde logo o direito à vida.

Portugal, fiel à sua aura de país de brandos costumes, fez a transição da ditadura para o regime democrático sem estabelecer um verdadeiro tribunal que viesse a julgar todos aqueles que foram responsáveis por meio-século de ditadura.

Ao contrário dos países que hoje julgam as suas ditaduras, Portugal terá entendido que poderia fazer as pazes com o seu passado dando uma espécie de amnistia aos executores da política de repressão do Estado, ou seja, pelas mortes e tortura que submeteram ao silêncio o país durante tão grande período.

Talvez porque o ditador-mor já tinha morrido anos antes ou porque aquele que o sucedeu havia sido "despachado" para o Brasil dispensou-se a necessidade de julgamento

Ficaram, contudo, por julgar aqueles que executavam fielmente a política do Estado-Novo e a que este chamou de "Polícia Internacional e de Defesa do Estado" vulgo PIDE.

Entre aqueles que fugiram do país e aqueles a quem bastou mudar a bússola e "aderir" ao advento da Democracia não houve ninguém que de forma objectiva tenha sido chamado a pagar pelos crimes que havia cometido.

Alguns dirão porventura que esta foi uma prova de maturidade democrática de um povo que soube conter eventuais impulsos de natureza perversa associados a julgamentos políticos ao estilo de ajuste de contas.

Outros, como eu, dirão que o problema reside na necessidade de manter viva a memória do passado para se acautelar o futuro e para isso seria necessário que a História registasse que os crimes de lesa-Estado não passam impunes e que um dia os responsáveis pelo período mais negro da História Contemporânea de Portugal foram chamados à justiça e devidamente julgados por isso.

Infelizmente não foi nada disso que sucedeu e por isso não é de estranhar que se verifique uma tendência preocupante para a desvalorização da importância da Revolução de Abril ao mesmo tempo que se atribuem pensões vitalícias a ex-inspectores da PIDE.

Não só não os julgámos como se fica com a sensação que o país aparentemente lhes deve estar grato por qualquer coisa, mesmo que não se saiba bem porquê. Assim vão as cousas.    

domingo, 17 de julho de 2011

In Memoriam

No filme “A Árvore da Vida” o realizador Terrence Malick aborda o triptico epistemológico da vida: De onde vimos, quem somos e para onde vamos.

A forma brilhante e comovente como o faz não procura em si mesmo dar resposta a qualquer destas questões, mas tão somente colocar o espectador perante uma reflexão interna sobre as mesmas, começando pela mais dramática das formas possiveis, a morte de um filho.

Do ponto de vista filosófico admito que a primeira e a última das questões primordias sejam aquelas que mais “desafios” colocam a quem se apreste a pensar sobre as mesmas.

No entanto a minha perspectiva assenta manifestamente na questão central sobre aquilo que somos.

É neste momento em que todos os nossos actos têm uma consequência directa independentemente da sua maior ou menor amplitude.

A capacidade de ditar o nosso próprio futuro acontece unicamente nesta fase.

Tanto a fase prévia e a fase seguinte caiem directamente nos campos insondáveis da natureza ou com especial relevo no turbilhão das crenças religiosas.

Em qualquer dos casos não é já o “nosso” momento.

A morte de alguém que muito se ama – independentemente das circunstância em que tal acontece - é porventura o momento de maior reflexão interna que qualquer pessoa pode aspirar a ter sobre si mesma.

É neste momento único e insondável que todas dúvidas sobre os nossos comportamentos e atitudes anteriores a essa morte vêm ao de cima.

As nossas acções e omissões são colocadas numa perspectiva que nunca poderiam ter sido postas anteriormente e, no essencial, resumem-se a uma única questão: estarei eu próprio em paz?

Não há provavelmente uma resposta racional para esta questão porque ela se coloca normalmente em momentos extremos quando precisamente a capacidade de reflexão é menor.

Então como proceder?

De uma única maneira: acautelar sempre e em qualquer momento que a resposta a essa questão seja dada no dia-a-dia, quando nada o necessite de justificar.

É tudo fazer para que (quase) nada fique por dizer ou (quase) nada fique por fazer relativamente áqueles que nos rodeiam e de quem gostamos.

É também procurar nada fazer ou dizer de que nos possamos arrepender mais tarde e esse momento chegará sempre e no seu expoente máximo no momento em que nos sentirmos precisamente mais fragilizados.

Conservo a convicção que a morte é isso mesmo: o fim de um ciclo, por isso mesmo todo o sentido desta reflexão ganha para mim um especial relevo embora convicto que também eu não estou – nem estarei nunca - em condições de responder à referida questão.

Há o antes e o depois e tal como em “A Árvore da Vida” há pelo meio um “filme” no qual somos todos “actores” e se bem sabemos que ele nunca terá um final feliz, pelo menos que possamos olhar para traz e dizer: Obrigado por tudo. Assim vão as cousas. 

Avó Adelina
13.04.1922 - 15.07.2011

domingo, 10 de julho de 2011

O edifício devoluto


"Vivemos todos sob o mesmo céu, mas nem todos temos o mesmo horizonte."

Não deixa de ser interessante a reacção dos principais lideres europeus a mais uma investida das agências de notação financeira relativamente à cada vez mais tristemente famosa divida soberana de Portugal.

Como é sabido nesta altura temos a mesma credibilidade de um Bangladesh, isto é e sem quaisquer rodeios, não somos dignos de confiança, ou de acordo com os parâmetros destes nossos "amigos" valemos lixo.

O que é extraordinário nas reacções inflamadas que se fizeram sentir um pouco por todo o lado é a aparente ausência de percepção que a posição assumida pela Moodys segue uma linha de actuação que em pouco mais de um ano "atirou" a Grécia, a Irlanda e mais recentemente Portugal para a dependência financeira externa.

E fizeram-no de uma forma bastante simples, ou seja, adensando nos famigerados "mercados" a convicção da incapacidade destes Estados em cumprirem com as suas obrigações ou melhor dizendo de pagarem as suas dividas.

A cada novo downgrading da divida soberana os mercados reagem com um novo aumento das taxas de juro da divida pública, obrigando os Estados a terem de suportar quase tanto valor em juros quanto aquele que pedem.

Ao longo deste tempo todo a Europa - a União Europeia - tem assistido de forma impávida e serena ao desmoronar das economias de alguns dos seus estados-membros, incapaz ela própria de reverter a fúria especulativa das agência de rating - a Moodys e as outras duas - e dos tais mercados de que todos ouvimos falar, mas ninguém parece perceber muito bem o que sejam exactamente.

Ao invés de uma reacção firme e concertada daquela que é maior comunidade de países civilizados e o maior pólo de desenvolvimento mundial a União Europeia parece ter optado por  alinhar num esquema que nada mais faz do que descredibilizar a ela própria, aparecendo associada a instituições como o BCE e o FMI, injectando biliões de euros nos países mais afectados impondo-lhes como contrapartida duros planos de austeridade que invariavelmente atiram os países em causa para uma recessão cujo final não se vislumbra.

Para poder dispor de tais montantes a UE socorre-se do denominado Fundo de Estabilização Financeira para o qual contribuem proporcionalmente todos os Estados-membros.

Proporcionalmente e solidariamente.

Ora é por aqui que a edifício europeu começa a ameaçar ruir porque cresce a convicção por parte dos países mais ricos que não estarão obrigados a "sustentar" alguns dos seus parceiros com o argumento que se eles se encontram na situação actual será por exclusiva responsabilidade própria.

Admitindo que exista algum fundo de verdade neste raciocínio a realidade é, contudo, mais complexa do que esta visão "simplista" parece transparecer.

A realidade é que no mesmo momento em que a Comissão Europeia, a Sra. Merkel e outros que tais "elogiam" e "aplaudem" a coragem das medidas de austeridade impostas em alguns dos seus parceiros reafirmando a convicção que os mesmos "se encontram no bom caminho", surge quase sempre de forma temporalmente coincidente uma qualquer agência de rating a querer dizer precisamente o contrário.

Uma verdadeira solidariedade europeia jamais permitiria uma avaliação dos Estados-membros por entidades com motivações desconhecidas, com sede numa economia concorrente e que na pratica contrariam, com recurso a métodos meramente especulativos, todas as iniciativas tendentes a "ajudar" os países em crise.

Provavelmente tal só virá a acontecer quando a "dúvida" atingir aqueles que em boa verdade dirigem os destinos da Europa comunitária, ou seja a França, o Reino Unido, a Itália, a Polónia em certa medida e, acima de todos, a Alemanha, precisamente aquela que no passado mais beneficiou da solidariedade europeia e que agora olha de cima para baixo todos os outros e que dita as regras com que todos temos de jogar.

Talvez tal cenário não esteja tão longe de suceder como se possa pensar, porque depois de arruinados aqueles a quem já chamam os PIGS (Portugal, Ireland, Greece, Spain) o tsunami dos mercados e das agências de rating chegará aos restantes, determinando provavelmente o fim do sonho (que virou pesadelo para alguns) da moeda única e, quem sabe, da própria União Europeia tal como a conhecemos hoje.

A frase que encabeça esta dissertação pertence a um senhor chamado Konrad Adenauer, um dos fundadores da Comunidade Económica Europeia. Devo reconhecer que tem algo de profético. Assim vão as cousas.

  







quarta-feira, 6 de julho de 2011

Escola Academia Sporting / Setúbal

Escola Academia Sporting / Setúbal

Aluno do Mês: Fevereiro 2011


"Sim, mereci este prémio, porque ajudei o professor, fiz bem os exercícios e estive sempre atento. O que mais gosto na Academia é de treinar e jogar. Dedico este prémio ao meu pai. Penso guardar este prémio no meu quarto, discretamente para a minha irmã não mexer. Quem também merecia ganhar este prémio era o Pedro Cobra. O jogador que mais admiro é o Liedson. Gostava mais ou menos de ser um profissional de futebol e gostaria de jogar no Sporting!"

domingo, 3 de julho de 2011

Filosofia nada barata

Nunca como agora a expressão “viram-se gregos” fez tanto sentido.

Tal acontece porque a mesma, cujo significado se perde no tempo, nos remete para a situação actual do povo grego.

Acredito convictamente que qualquer natural deste que é um dos países mais importantes da história e cultura do mundo ocidental se questione como é que se chegou a uma situação como a presente.

Em bom rigor parte da resposta pode e deve ser dada pelos próprios, na medida em que é mais ou menos evidente que estão a pagar a factura de anos a fío de políticas económicas desastrosas num país que pouco mais produz que as suas próprias condições naturais para o turismo.

Ou seja, é de esperar que ao fim de muitos anos a gastar mais do que aquilo que se produzia alguém haveria de apresentar a conta ou, como veio a acontecer, passar a impor as regras com que se haverão de governar.

Ora para tal não falta quem se disponha a dar uma “mãozinha” com sabor a presente envenenado, e esse alguém é a própria União Europeia através do “famoso” fundo de estabilização financeira, o BCE mas também as gentes do FMI.

E de facto é isso que tem sucedido e em grandes tranches para “ajudar” a Grécia a voltar a entrar no eixos ou, no minimo, impedir que se afaste tanto deles que algum dia venha a fazer o caminho inverso áquele que trilhou em 1981 e fique na história como o primeiro país a saír da moeda única e, quiçá mais tarde, da própria União Europeia.

O problema é que em paralelo com toda esta vontade de “colaborar” existe uma realidade sem rosto que joga em contra-ciclo com com a esta “solidariedade” e que nada mais faz do que afastar a Grécia do seu objectivo principal.

Essa realidade são os tristemente famosos Mercados que têm literalmente arrastado os gregos para um nível inferior ao do lixo.

Ao fazerem-no lançam um anátema de prováveis incumpridores, obrigado o governo grego a sucessivos novos planos de austeridade de modo a procurar corrigir o desvio das suas contas públicas, mas igualmente pela necessidade de demonstrar a referida capacidade de pagar aquilo o que deve ou seja nesta altura provalmente mais do que já devia no inicio desta triste história.

A juntar a isto tudo constata-se que não existe a minima capacidade de entendimento interno no sentido de se poder “caminhar” num mesmo sentido, que não é mais nem menos do que o da sua própria salvação.

Cansados do protagonismo involuntário de qualquer novo plano de austeridade os gregos acumulam greves gerais, instabilidade social e uma preocupante incapacidade de união dos principais partidos que só tem sido amenizado pela existência de uma maioria absoluta parlamentar do partído do Governo.
No meio disto tudo temos visto e ouvido muitas das personalidades que se têm pronunciado sobre este mesmo tempo comparando a situação grega com a portuguesa.

Por mais que se queira evitar o assunto e a comparação que lhe está subjacente a verdade é que não podemos fugir ao mais do evidente paralelismo com a situação que actualmente se vive em Portugal.

Não podemos negar as evidências como se fosse mera coincidência a sucessão de planos de austeridade, a redução constante do rating da república e das suas principais instituições financeiras, o aumento galopante dos juros da dívida soberana e, mais recentemente, a necessidade de intervenção desse triunvirato a que se convencionou chamar de “troika”.

Outra das prováveis comparações é aquela a partir do qual os respectivos governos insistem em afirmar que toda esta austeridade é necessária e que o último dos planos será isso mesmo o último, até se constatar que não chega.

Invoca-se o discurso da “verdade” como se dessa forma tudo se tornasse menos dificil.

A verdade, contudo, é algo que ninguém conhece na sua plenitude nem é certamente aquela que é prometida durante as campanhas eleitorais.

Neste período há verdades que são escondidas por detras de omissões, daquilo que não se diz, como se a omissão não fosse ela própria uma forma de mentira.

Podemos continuar a afirmar que a Portugal não está na mesma situação da Grécia.

Contudo, os gregos poderão razoavelmente afirmar que Portugal está agora num ponto onde eles próprios já estiveram, resta saber se os iremos continuar a acompanhar até a um provável precipicio. Assim vão as cousas.