domingo, 26 de setembro de 2010

Feira do Livro (1)


"Citações e Pensamentos de Eça de Queirós" de Paulo Neves da Silva



Cinefilia (1)

A sombra do guerreiro (1980)

Os chineses que se cuidem

Volta e meia renova-se o discurso sobre o número de feriados e de pontes de que "beneficiam" os portugueses.

Recentemente tal voltou a acontecer.

Diz-se em abono da teoria que defende que em Portugal existe um numero exagerado de feriados que a nossa competitividade fica afectada pelo facto da produtividade das empresas se "ressentir" da ausência, ainda que por motivo justificado, dos respectivos trabalhadores.

A este facto junta-se o gozo das famosas "pontes" ou seja, aproveitar a proximidade de calendário do fim-de-semana e tirar um dia de férias, permitindo que, na prática, se possa em teoria descansar um pouco mais de tempo.

Ora, esta questão na forma como é trazida a público está eivada de uma profunda demagogia, começando exactamente pelas famosas "pontes".

Em bom rigor estes dias não correspondem a faltas ao trabalho mas sim a dias de férias que as pessoas, legitimamente, utilizam em seu beneficio nesses dias não o fazendo, portanto, noutra altura qualquer. O direito a esse dia já pré-existia, não corresponde a nenhum beneficio extraordinário.

Por outro lado falar-se em quebra de produtividade pelo facto de haverem muitos feriados é procurar esconder uma realidade que é a que deriva da falta de produtividade geral nos restantes dias. Entender-se o contrário é admitir que se porventura não houvesse qualquer feriado em Portugal estariamos hoje no "pelotão" da frente dos países europeus em termos de competitividade. Alguém acredita nisso?

É certamente muito mais fácil apontar o dedo ao problema do que resolve-lo e isso, no fundo é o que se passa em Portugal.

Acresce que o feriado em si até terá vantagens para o país, porque é certo que nesses dias a generalidade do comércio está aberto ao público e por isso mesmo as pessoas têm nesses dias a possibilidade de efectuar calmamente as suas compras, aumentando por essa via os niveis de consumo ou seja aumentando a produtividade das empresas que optam por abrir em dias feriados.

Mas não será também que o gozo de um feriado pode ter um efeito positivo para o proprio funcionário permitindo-lhe um dia extra de descanso? Do maior ou menor grau de descanso não poderão resultar beneficios ou prejuizos na produtividade da empresa? Parece-me evidente que sim.

Todos estes argumentos poderiam até nem ser necessários quando verificamos que, por exemplo, a Austria tem tantos feriados como Portugal. Em que é que ficamos? O que nos torna então diferentes deste país da Europa Central com um dos melhores niveis de vida do mundo?

O que nos torna diferentes (certamente entre muitos outros aspectos) é a forma como encaramos todos os restantes dias.

Talvez seja então a hora de largar a demagogia reinante e focalizarmo-nos no essencial, começando por exemplo por não se perder mais tempo com este assunto. Assim vão as cousas.








Melomania (1)

Johann Sebastian Bach - Matthaus Passion - 39. Aria A - Erbarme dich

Roteiros (1)

Azulejo mourisco - Sevilha (Setembro 2009)

domingo, 19 de setembro de 2010

O próximo na fila

Uma sondagem recente veio recolocar o PSD atrás do PS nas intenções de voto dos portugueses.

Será, porventura, interessante fazer uma avaliação da forma como o Dr. Pedro Passos Coelho "consegue" em tão pouco tempo descer de uma posição que lhe conferia, na prática, uma maioria absoluta, para a situação que se evidencia na supra citada sondagem.

O Dr. Pedro Passos Coelho conseguiu criar - e bem - à volta dele uma aura de vencedor, fruto de uma eleição muito confortável no Congresso do PSD, tendo alguém afirmado na ocasião que o PSD "arranjou o seu Sócrates".

Deu nas vistas ao viabilizar o PEC, tendo sido elevado à categoria de "grande estadista"!

As sondagens subiram em flecha, e o Dr. Pedro Passos Coelho vestiu o fato de proto-Primeiro Ministro. Tudo parecia correr bem.

Acontece que um estadista não se forma pela acção isolada dos seus actos mas pelo conjunto das decisões determinantes que se tomam ao longo de uma carreira politica. A não ser assim, das duas uma, quem invoca por exemplo o Dr. Sá Carneiro (e tantos o fazem!) está a desvalorizar o seu contributo para a politica, ou então o Dr. Pedro Passos Coelho não pode ainda suportar o epíteto de estadista.

O Dr. Pedro Passos Coelho errou ao querer inundar a opinião pública com diversas frentes de combate, esquecendo que a memória colectiva é curta e que mais vale uma posição bem explicada, do que diversas por explicar.

Mas não tem sido apenas por aí que as coisas têm corrido menos bem.

A iniciativa de lançar para o debate público a revisão da Constituição veio colocar claramente a nú a sua deriva neo-liberal, numa época em que todos reclamam do Estado uma intervenção mais decisiva na protecção das classes mais desfavorecidas, cujo numero cresceu exponencialmente como consequência da crise internacional de que apenas agora se consegue ter uma visão clara das suas repercussões.

Trazer para a centro do debate politico a "extinção" do estado social, o fim do regime semi-presidencial, do método de Ondt, etc, no actual contexto social é, em definitivo, dar um verdadeiro "tiro nos pés". Atente-se no documento que foi posteriormente entregue na Assembleia da República e vejam-se as diferenças relativamente ao projecto inicial. Nada mau para um partido que "não recua, não anda para o lado"....

Já o referi numa dissertação anterior que propor o alargamento do mandato do Presidente da República em ano de eleições presidenciais ou do próprio Governo quando se tem a expectativa de a curto prazo vir a governar tresanda a golpe de estado constitucional.

Aquando da OPA da Telefonica à Vivo deslocou-se a Espanha para atacar a decisão do Governo de utilizar a "Golden Share" num gesto que, no minimo, poderá ser apelidado de pouco patriótico. O que mais se estranha é que nessa ocasião o PSD tenha afirmado que se tratava de "um mau negócio" mas que o Estado não devia intervir desta forma na economia. Sobre o desfecho final deste mesmo assunto nem uma palavra.

A gestão do malfadado assunto das SCUTS é outro tema que não colheu na opinião pública. O PSD surge a defender que o principio do utilizador-pagador tem de ser universal, logo aplicável a todas as actuais vias "sem custos para o utilizador" e sem qualquer regime de excepções.

Ao fazê-lo (e na minha opinião, bem!) tem de estar preparado para arcar com as consequências politicas dessa posição, facto que não veio a acontecer, tendo-se demarcado de forma inexplicável da decisão final, para cujo formato contribuiu no âmbito das negociações que teve com o Governo.

Por outro lado cai sempre mal na opinião pública a difusão de mensagens com cariz de ultimato (para não chamar chantagem) ameaçando-se com uma crise politica se o partido do Governo não aceitasse as exigências do PSD a propósito da elaboração do Orçamento de Estado para 2011, anunciando-se uma data limite para tal aceitação: 9 de Setembro de 2010.

Por fim não é credivel o PSD querer fazer crêr que não é ele próprio - a par do PS - o responsável por parte dos males (mas também de parte do que há de bom) de Portugal, quando todos sabemos que a governação deste país está entregue a ambos os partidos, de forma quase alternada, desde o 25 de Abril de 1974. Apagar o passado não é boa politica, porque é também com os ensinamentos da história que se constroi o futuro (um grande estadista jamais ignoraria esta realidade).

As oposições em Portugal desabituaram-se de formar os célebres "governos-sombra", isto é, dar a conhecer aquilo que fundamentalmente os diferencia do partido do Governo. É muito mais fácil enveredar pela lógica do "quanto pior, melhor".

Não adianta andar a falar que o país está à beira do abísmo financeiro sem se saber se com o Dr. Pedro Passos Coelho o iremos evitar (e como) ou, como dizia um ex-presidente brasileiro, com ele "daremos um passo em frente".

Por tudo isto começam já a ouvir-se as vozes internas no PSD (normalmente as mesmas de sempre) que estão descontentes com o "rumo" do partido.

Suspira-se agora pelo Dr. Rui Rio. Parece que esse é que é mesmo bom. Assim vão as cousas.

domingo, 12 de setembro de 2010

Tinta azul

Falar de censura em Portugal nos dias que correm tornou-se mais ou menos recorrente.

Será, contudo, correcto falar-se de uma verdadeira censura numa sociedade global como a nossa? Estou absolutamente convencido que não.

Entendo, aliás, que existe um verdadeiro paradoxo na convicção de que exista alguma forma de condicionamento da liberdade de expressão. É que em regimes ditatoriais não é, tão pouco, possivel falar da propria censura.

Os exemplos na nossa Sociedade são suficientes para se perceber que quem mais fala de censura é quem mais usa da prorrogativa da liberdade de dizer o que bem lhe entender.

Ao ler as crónicas de Eduardo Cintra Torres ou de José Manuel Fernandes, ambos jornalistas do Público, quando falam sobre o dominio dos poderes politicos sobre os orgãos de comunicação social, questiono-me se não são eles próprios a demonstração do contrário do que pretendem afirmar.

Ouvimos de forma preocupada a rábula do jornalista Mário Crespo que "ouviu" alguém que tinha "ouvido" que o primeiro-ministro, durante um repasto, se referiu a ele proprio como um "problema" que era necessário "resolver" (versão, aliás desmentida pelo próprio director do canal de televisão, também ele presente no local da "conspiração). Uma semana depois surge nas estantes um novo livro baseado numa crónica supostamente "censurada", livro este sobre o qual o jornalista Mário Crespo refere que "preferia não ter escrito" (curioso livro este que é escrito, editado e publicado numa semana).

Ou, "last but not least", a cada vez mais do que evidente agenda politica do casal Moniz na TVI, assente numa produção de novos factos politicos - normalmente com o mesmo visado - apresentados a um ritmo vertiginoso, cujo estilo era, inclusivamente, contestado por destacadas referências da classe jornalistica. No fundo vale a lógica de que dois factos desgarrados se apresentados no mesmo contexto, formam um conjunto coerente (ao estilo Michael Moore em relação aos podres da América).

Então pergunto-me: não será então que estaremos perante um movimento inverso, tão comum noutros países, de condicionamento da acção politica devido a impulsos, mais ou menos corporativo, das linhas editoriais de alguns orgãos comunicação?

A ser verdade, não será esta também uma forma de censura? Não deve ser, porque na verdade podemos falar dela. Assim vão as cousas.



domingo, 5 de setembro de 2010

Vox Populi

Recentemente o CDS-PP propôs qualquer coisa como um referendo para a "área da justiça".

Só poderei compreender esta proposta à luz do habitual populismo e demagogia deste partido. Não creio, pois, que a mesma possa ser levada a serio, admito mesmo, pelos seus próprios subscritores.

O preocupante não é que exista efectivamente o risco de chegar a haver tal referendo, o preocupante é que alguém tenha chegado a pensar nisso, nomeadamente pessoas com responsabilidade públicas e, admite-se, com expectativas de chegar ao poder.

Devolver a voz aos cidadãos em matéria de justiça "cheira" a promoção dessa figura medieval da justiça popular.

Num estado de direito, onde vigora o principio da separação de poderes, ao parlamento compete a elaboração das leis e aos tribunais a sua aplicação. Estes poderes não se confundem - e ainda bem - com nenhum outro. Ora, se assim é, como é possivel, ainda que teoricamente, admitir que seja o cidadão comum a definir os caminhos futuros da justiça?
Por estas e por outras confesso-me como um claro opositor ao instituto do referendo.

O referendo constitui, na maior parte das vezes, uma forma de desresponsabilização da classe politica pelo que, fundamentalmente, este instituto constitui uma falsa forma de legitimidade.O mandato dos politicos é conferido pelos cidadãos, em eleições livres, nas quais se escolhem para além dos seus representantes, os seus programas politicos, que são legitimados pelo voto.
Mas se analisarmos o que foram as experiências plebiscitárias de democracia directa em Portugal chegaremos igualmente a conclusões que nos permitem concluir pela inutilidade deste instrumento, a saber:
  • Em primeiro lugar tem-se constatado que a participação dos cidadãos é extremamente reduzida. Casos houve em que nem metade da população com capacidade para tal participou no escrutinio, comprometendo a validade legal do acto;
  • Em segundo lugar, há uma clara noção que a generalidade das pessoas não vota em função da sua própria convicção, mas de acordo com as directrizes dos partidos que elas normalmente apoiam;
  • Em terceiro lugar, a análise aos resultados é feita ao sabor das conveniências politicas. A abstenção é normalmente "lida" como uma forma de rejeição, como se a ausência de voto pudesse, em abstrato, ser interpretada num sentido ou noutro;
  • Em quarto lugar fica a determinação das pessoas que resolve participar nos referendos com o seu voto, cuja inutilidade prática pode, nessa mesma noite, constatar. A apetência destas pessoas para uma participação futura noutro acto semelhante será certamente menor.
Com tudo isto o país gastou o dinheiro que não tem para agendar um evento que não configura qualquer resultado útil.

Perguntamo-nos: fará então sentido manter a admissibilidade do referendo?

Porventura fará, mas as regras terão de ser outras. Entendo que o recurso à figura do referendo só fará sentido mediante a verificação de duas circunstâncias cumulativas:
  • Que a validade do acto seja aferida em função dos votos efectivamente expressos e não em função da totalidade de eleitores;
  • Que o objecto do referendo verse sobre matérias de natureza verdadeiramente excepcional, que não possam ser objecto de legislação própria emanada da Assembleia da República, nomeadamente se tais matérias não constarem do respectivo programa eleitoral do Governo em funções.
A não ser assim estaremos perante uma evidente perda de tempo e de recursos.

Já que se aprestam para rever a Constituição aproveitem e retirem dela esta figura ou mudem-lhe as regras. Ou será necessário um referendo para isso? Assim vão as cousas.