Quando em 2008 “rebentou” a actual crise financeira internacional
diversas foram as instituições financeiras, sobretudo norte-americanas, que
surgiram na “frente do pelotão” como sendo as principais responsáveis por essa
mesma crise.
Entre as referidas instituições figurava o nome da Goldman Sachs
Internacional (GSI) que, entre outros “pecados“, é acusada de aconselhar os seus
clientes a apostar no colapso financeiro da Europa, através de um mecanismo –
aparentemente infalível – levar os investidores a crerem que um determinado
país se encontra em situação de insolvência, levando-o à necessidade de contrair
sucessivos empréstimos a taxas próximas do conceito de agiotagem, cuja
consequência para os nacionais desses mesmos Estados tem sido, nada mais, nada
menos, do que a famosa “receita” da austeridade, com as consequências que são
hoje conhecidas e reconhecidas.
Durante um período que terminou de forma estranhamente coincidente com o
referido ano em que a “bolha” rebentou, um português, o Sr. B. (a minha singela
homenagem às personagens kafkianas) desempenhou as funções de Vice-Presidente
do Concelho de Administração no GSI.
Dois anos mais tarde haveria o mesmo Sr. B. de ser nomeado Director do
Departamento Europeu do Fundo Monetário Internacional (FMI), ou seja,
precisamente aqueles que haveriam de estar na dianteira dos maiores empréstimos
na história desta instituição - supervisionados precisamente pelo Sr. B. - consequência
lógica de um processo que, levando os Estados a uma quase impossibilidade de
financiamento nos “famosos” mercados, os “empurrava” para um inevitável pedido
de “auxílio” externo.
Contudo, esta “estadia” do Sr. B. no FMI haveria de durar apenas cerca de um
ano, tendo cessado em condições pouco esclarecidas, havendo mesmo que
refira que por detrás das sempre oportunas “razões pessoais” estaria a sua
ligação anterior ao GSI, nomeadamente ao papel determinante que este banco teve
na “engenharia” financeira levada a cabo durante anos pelos gregos através da qual
se “encenava” aos olhos do Mundo (e em particular à Europa) um cenário de “comédia”
onde afinal se escondia uma "tragédia", ou mais adequadamente, uma farsa.
Nada, no entanto, que impeça o Sr. B. de fazer uma rápida transição para
o outro lado da “barricada” e, para isso, depois de fazer parte dos
resgatadores o passo “lógico” seria o de integrar a equipa dos resgatados.
Dito de outra forma, num dado momento define as políticas de
privatizações e de renegociações das denominadas parcerias público-privadas e
no momento seguinte lidera a equipa do Governo que há-de implementar essas
mesmas políticas.
Os mais bem-intencionados dirão que tal se deve ao conhecimento dos
processos, outros, porventura dotados de outro conceito de avaliação dos factos, dirão que é por conhecer bem demais os processos, passando dessa forma a deter
um poder nada despiciendo de “encontrar” os parceiros “adequados” no sector
privado para largos milhares de milhões de activos do Estado.
Pelo meio de tudo isto a palavra “crise” parece ser algo que não parece
afectar o Sr. B. que do alto do seu salário com 6 dígitos, surge com uma
preocupante frequência a fazer uso da sua cátedra, salientando a necessidade de
fazer reduzir os salários dos trabalhadores portugueses, dando a essa medida um
verdadeiro significado de emergência nacional.
Na “retina” ficam igualmente algumas dissertações públicas do Sr. B.
sobre determinadas matérias que – julgávamos nós – seriam da competência
exclusiva do Governo mas que, à falta de um ministro competente, parecem ter
sido delegadas para alguém que à pergunta se haverá despedimentos no processo
de concessão da RTP, responde com uma confrangedora indiferença: “se tiver que
ser”, certamente à luz do seu entendimento do despedimento com uma “oportunidade”
o que, bem vistas as coisas, não deixa de ser coerente com o seu próprio
percurso.
A dúvida, contudo, que persiste é a de saber de quem assim pensa o que é
que - razoavelmente – o Sr. B. “produz” ou, dito de outra forma, qual a riqueza
para o interesse geral que advém das funções que exerce, seja na Administração
da GSI ou como consultor do Governo para as privatizações.
Entendo que, até para o próprio, será sempre uma tarefa difícil responder
a esta questão, na medida em que o interesse público é um ambiente que lhe é
manifestamente estranho, tão vasto é o seu currículo ao serviço de interesses
privados, repleto de estranhas coincidências que sistematicamente o colocaram
na “linha da frente” contra a causa pública e o interesse dos cidadãos de um
país que, creio não me enganar, é também o seu. Assim vão as cousas.