domingo, 3 de novembro de 2013

Comédia de enganos


A aparente contradição entre um qualquer facto de comédia e o acto de enganar alguém é, em si mesmo, uma aparente contradição mas foi precisamente esta a base de uma tipologia de enredos em que o engano, o faz-de-conta, a encenação, o deslumbramento, as paixões ou a própria verdade – porventura o mais duro de todos os enganos – é o motivo gerador do riso alheio.

Mas é também o título de uma famosa obra de Shakespeare cujo enredo anda à volta de encontros e desencontros amorosos, de ciúme, entre outros estratagemas que não cabem aqui narrar.

Contudo, este parece ser precisamente o título adequado para a mais recente e desinteressante polémica tornada pública entre o mediático casal Manuel Maria Carrilho e Barbara Guimarães.

Obviamente não me deterei um segundo que seja a discorrer a absurda panóplia de circunstâncias que diariamente nos “conduzem” à vida privada do casal mas apenas a minha visão sobre as causas da exposição pública dessa mesma vida privada -  seja desta ou de outras “personalidades” - normalmente reconhecidas e reconhecíveis como “figuras públicas”.

Ora sucede que um tal epíteto não surge grande parte das vezes em resultado de qualquer reconhecimento público de uma especial vocação ou actividade do qual resulte uma mais-valia para si próprio ou para terceiros.

Pelo contrário, a caracterização como “figura pública” resulta quase exclusivamente a exposição pública (claro está) das respectivas vidas privadas.

E fazem-no sem qualquer pudor e, provavelmente, a troco de uma compensação monetária, forma suis generis de remuneração da inutilidade tornada útil do ponto de vista das vendas das “revistas da especialidade” ou de um ou outro órgão de informação menos dotado de um critério próprio na avaliação da qualidade do interesse jornalístico de um tema que, no fundo, não o deveria ser.

Desta forma, somos “convidados” sistematicamente a “entrar” dentro da casa – e por arrastamento das vidas – dos cicerones de circunstância, partilhando como se fossem nossas as respectivas alegrias e a imagem de uma felicidade que nada nem ninguém parece conseguir (aparentemente) perturbar.

Sucede, porém, que a vida não é apenas feita de tais momentos de bonomia e, por vezes, teima a “pregar partidas” fazendo cair a máscara com que tais personagens parecem viver em permanência, mostrando ao mundo a verdadeira face de quem, afinal de contas, não é diferente dos demais.

O problema é que se para “comum dos mortais” tal circunstância é apenas mais um facto com que terá de lidar e para qual terá de procurar a respectiva solução no contexto da sua vida privada, tal já não é possível para esta espécie de “heróis de pés de barro” porque precisamente deixaram de a ter – quase sempre de forma voluntária – há bastante tempo.

Nessa ocasião torna-se (quase) impossível impedir ou, pelo menos, suavizar o ímpeto voraz de quem se habituou a viver da vida alheia, expondo uma imagem até então desconhecida mas que, por isso mesmo, se tornou agora a mais apetecível.

Pessoalmente, não creio ser possível associar as vidas de tais pessoas a uma comédia ou, pelo contrário, à imagem de uma tragédia. Trata-se apenas da vida tal como ela é, mas que os próprios – eventualmente para sua desgraça - se recusam a entender e aceitar como tal.

E esse é o seu verdadeiro engano. Assim vão as cousas.

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