De acordo com uma informação recentemente tornada pública
a Igreja Católica em Portugal estará a perder, de forma sistemática, parte
significativa dos seus seguidores.
Esta “confissão” por parte da hierarquia da igreja tem
tanto de surpreendente como de evidente.
É surpreendente porque raramente no passado a Igreja se
dispôs a esta reflexão na medida em que da mesma decorre uma exposição
mediática que “alimenta” as máquinas editoriais dos órgãos de comunicação o
que, no limite, poderá colocar em causa a dita hierarquia.
Do mesmo modo não posso deixar de entender esta
constatação como evidente posto que a mesma era por demais visível para ser
ignorada, mesmo aos olhos de quem assumidamente não professa a religião cristã.
Os motivos para este afastamento são certamente diversos e
divergentes quanto à sua possível interpretação, pelo que não pretendo eu
próprio sobrepor-me a essa discussão, facto que ainda assim não me impede de
reflectir sobre a mesma.
Fundamentalmente o meu entendimento é de que a ausência de
fiéis nas igrejas não se deve necessariamente à ausência de fé ainda que, como
sempre aconteceu ao longo da História, tal constitua um motivo óbvio para o
abandono das celebrações cristãs.
O que se passa será mais uma reacção à própria forma como
a mensagem de fé é transmitida actualmente quer ao nível da mensagem pública
quer ao nível daquele que é o seu “auditório” por excelência, isto é, o das
próprias igrejas.
Este nosso mundo é hoje muito distinto daquele que era há
uma década atrás e certamente ainda mais dispare relativamente às décadas
anteriores e, mesmo que tal nem sempre constitua o registo de uma evolução
civilizacional, a verdade é que se o “tal” mundo mudou foi porque as pessoas
mudaram.
Ora esta mudança deve-se, em grande parte, à força
“esmagadora” como os nossos comportamentos são condicionados pela massificação
da informação, a qual surge por todas as vias, como se fossemos todos a
personagem do filme “Laranja Mecânica” do realizador Stanley Kubrick quando
este é forçado a assimilar imagens desagradáveis para moldar os seus
pensamentos e, por arrastamento, as suas acções futuras.
Ressalvadas as devidas diferenças torna-se evidente que
daí resulta uma maior exposição das pessoas a correntes de pensamento
diferentes – e, por vezes, divergentes – da linha de orientação da igreja
católica.
Daqui resulta que não é tanto a fé que muda ou
simplesmente desaparece, mas sim a forma como se interpreta a fé que muda radicalmente
até um possível momento em que se opera uma mudança na auto-convicção que o
“exercício” da mesma não passa necessariamente pela frequência do espaço físico
de uma igreja.
Acresce a este facto que a “mensagem” que é transmitida
por sacerdotes e restantes membros do Clero não terá sofrido a eventual
necessidade de adaptação ao “discurso” dos tempos que correm, já para não falar
na absorção de alguns temas – ditos fracturantes – que para além da polémica
que lhes está inerente tem vindo a ser objecto de regulação em boa parte dos
países civilizados em rotura clara com a doutrina da igreja, quedando-se
“presa” aos seus próprios dogmas.
Numa perspectiva de carácter mais filosófico podemos ainda
imaginar que o distanciamento se verifica igualmente como reflexo pelo aumento
de um sentimento de frustração por um Mundo essencialmente injusto,
em que não parece haver lugar para uma resposta aos anseios de quem sofre com
as guerras, a fome e outras tragédias que tais a quem ninguém parece valer,
seja a boa vontade dos homens seja a infinita misericórdia divina.
No entanto, creio que haverá uma outra abordagem a fazer e
que resulta da constatação que boa parte dos fiéis “tresmalhados” fizeram
simplesmente uma espécie de transição para outras confissões religiosas ou
ainda para outros movimentos normalmente apelidadas de seitas.
Talvez fosse por aqui que a igreja Católica devesse
começar a sua tarefa de retomar os caminhos da fé dos seus “desapontados”
seguidores, isto é, percebendo o motivo pelo qual mais do que “perder” a fé as
pessoas a procuram noutros lados.
A resposta a esta questão é extremamente complexa e,
creio, não se encontra dissociada dos tempos de crise em que vivemos em que,
mais do que tudo, as pessoas procuram respostas para as suas dúvidas e expectativas.
E, sobretudo, querem respostas rápidas e nesse capítulo específico não falta
que as possa prometer nem que seja a troco de uma compensação de natureza bem
terrena.
Na base desta “adesão” a quem surge como a solução rápida
para qualquer problema está a fragilidade com que alguém se apresenta perante
esse mesmo problema relativamente ao qual os modelos ancestrais de devoção
parecem já não fazer sentido.
É esta a encruzilhada que a Igreja Católica enfrenta
actualmente e da qual a própria só estará em condições de escolher o caminho
adequado se, mais do que tentar interpretar os sinais divinos, começar também a
escutar as mensagens das pessoas. Assim vão as cousas.
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