domingo, 6 de outubro de 2013

Peço a palavra

Uma semana depois do último escrutínio popular ocorrido em Portugal tendo por pano de fundo as denominadas eleições autárquicas, nas quais o PSD "registou enquanto tal uma derrota eleitoral nacional." (Pedro Passos Coelho dixit) surgem cada vez mais vozes - umas com mais rosto do que outras - a "exigir" um Congresso Nacional Extraordinário (CNE).

Parece-me, pois, oportuno expressar a minha opinião sobre esta espécie de concílios partidários que, por vezes e de acordo com esta mesma nomenclatura marcadamente eclesiástica, assumem a forma de conclaves.

Retenho a este propósito uma expressão utilizada em seu tempo por um ex-professor de Ciência Politica, o Dr. Fernando Seara (curiosamente um dos grandes derrotados da noite eleitoral) que, a propósito destes congressos, dizia que os mesmos já se encontravam decididos mesmo antes de começarem.

Confesso que, desde então, não consigo afastar esta expressão da minha cabeça cada vez que "olho" para um qualquer Congresso partidário, seja ele ordinário ou extraordinário.

No essencial e sem que alguma vez tenha tido a possibilidade de participar em tal evento - algo que dificilmente alguma vez virá a suceder - a verdade é que parece tratar-se de um exercício de puro masoquismo aquele que os congressistas se submetem durante as habituais 48 horas do evento, com os "trabalhos" a começarem normalmente cedo e a terminarem quase sempre "noite dentro".

Mas o que sucede, afinal, durante este período de especial "agitação" partidária?  

Aparentemente tudo mas, em termos práticos, nada.

Aquilo que parece suceder são verdadeiras maratonas de discursos que a história -com raríssimas excepções - jamais lembrará, em que os oradores inscritos falam para uma plateia que invariavelmente os aplaudirá, com mais ou menos entusiasmo.

De resto e de congresso para congresso aquilo que parece mesmo mudar é o respectivo pano de fundo e, naturalmente, os oradores.

Ora, sobre aquilo que não há nada a dizer torna-se dificil aos jornalistas - e são normalmente muitos - exercer o respectivo trabalho, o que vale por dizer "arranjar" matéria que justifique uma "entrada em directo" ou um mero tema de conversa.

Por isso mesmo o interesse jornalístico tende a recair sobretudo sobre aqueles oradores que, de alguma forma, quebram uma espécie de unanimidade que tende a instalar-se nos Congressos e decide fazer o chamado discurso "polémico" que, também ele, será aplaudido mesmo que seja efectuado em manifesto antagonismo com os seus precedentes e os seus subsequentes.

Mas a atenção recai normalmente também sobre um ou outro congressista que, saindo do anonimato - inclusive dentro do seu próprio partido - se destaca dos demais, não necessariamente pelo conteúdo do seu discurso ou do carácter inovador das suas ideias, mas pela forma "pouco ortodoxa" com que as exprime perante os seus correlegionários.

Tirando isso resta, quase sempre, esperar pelo discurso inicial e pelo discurso final do líder partidário, que pode até nem ser o mesmo caso o Congresso se destine - como por vezes acontece - a eleger um novo líder.

Mas também aqui é raro haver surpresas em linha, aliás, com o que afirmava o Dr. Fernando Seara.

É que ou essa eleição já está decidida por ter sido precedida de um escrutínio distrital do partido ou a disparidade de forças entre o candidato favorito e os demais é tão evidente que o acto eleitoral em si mesmo não é mais do que um mero exercício de legitimação da liderança com uma oposição interna meramente aparente.

Terminado o Congresso o partido que o promoveu alude ao sucesso do mesmo e ao "profundo debate de ideias" que dele resultou ao mesmo tempo que os convidados dos outros partidos remetem quase sempre para o seu oposto, isto é, a "falta de ideias".

Arrumam-se as mesas e as cadeiras e tudo aquilo que por ali se passou será igualmente "arrumado", condenado a um inexorável esquecimento. Venha, portanto, o próximo porque nestas coisas dos Congressos o que os políticos verdadeiramente gostam é de se ouvir a eles próprios. Assim vão as cousas. 

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