Num qualquer dia da semana passada
cruzei-me na rua com uma "imagem" real que me reteve a atenção.
Tratava-se de uma senhora de idade que
acompanhava um jovem que, presumo, não teria mais de 13/14 anos, de quem a
referida senhora seria a respectiva avó, sem que consiga efectuar
semelhante exercício de antecipação da sua possível idade.
A cena era "típica": o jovem em
frente, em passo apressado e a senhora, incapaz de acompanhar tal ritmo, seguia
imediatamente atrás.
O "tempo" de cada um já não é o
mesmo, nem a percepção que cada um tem da presença de ambos naquele local e
naquele momento.
Mas é precisamente este o elemento que
mais impele a escrever sobre ele, isto é, que "tempo" é afinal este
que os separa, sem conseguir deixar de imaginar esta mesma "cena" com
outros "intérpretes" há vários anos atrás.
Remete-me a mim próprio para um certo dia
em que ao regressar da escola encontrei a minha avó que me aguardava de
surpresa e passei por ela dizendo simplesmente "olá avó", assim, sem
mais, indiferente, mas marcando para sempre aquela imagem na minha memória como
se de uma tatuagem se tratasse.
Se também aquele jovem aparenta ignorar,
como se de um leve fardo se tratasse, a presença da sua avó na sua retaguarda,
certamente para a idosa a possibilidade de estar ali a acompanhar, mesmo que à
distância, o seu neto estará muito para além de algo que lhe possa ser
irrelevante.
A existência de uma
geração entre eles acentua tudo aquilo que aquela idosa tem para transmitir,
toda a sua experiência de vida e todos os seus ensinamentos mesmo que, como uma
folha amarelada do tempo, tudo passa parecer desfasado ou antiquado.
Mas o "papel"
dos avós ao longo dos tempos sempre foi este e creio sempre será, mesmo que a
Sociedade vá mudando e com ela também as pessoas e as suas formas de
relacionamento.
Numa sociedade
marcadamente rural durante grande parte da sua história, era esta mesma
experiência e estes mesmos ensinamentos que permitiam à geração assegurar a
continuidade da sua própria auto-subsistência, através da capacidade de
perceber a importância - quase devoção - da terra, dos animais e até, sem o
sentido actual do tema, da importância da protecção do meio-ambiente.
Mas também a noção que
nada dali se obtém sem esforço, sem sacrifício e que os "tempos"
da natureza não se compadecem com períodos "suspensão" para gozo de
férias, feriados ou fins-de-semana.
Nas cidades era por ali
que passava uma certa noção de estabilidade, assegurando uma presença
constante, de maior proximidade entre as gerações, uma espécie de garante
permanente de um membro da família que "compensava" o progressivo
"afastamento" dos pais.
Em qualquer dos casos,
no campo ou na cidade, eram eles que mais do que falar, sabiam ouvir, sem quase
contestar, mesmo que discordando, ou sequer compreendendo o que se lhe dizia,
no fundo é como se também neste capítulo não se incomodassem de
"andar" dois passos atrás.
Contudo, o seu
"papel" e a compreensão do mesmo não são - alguma vez o foram?
-necessariamente entendidos por quem os escuta ou simplesmente para eles
olha, gerando não raras vezes o efeito contrário do distanciamento por parte
daqueles de quem precisamente mais gostam.
E este é, provavelmente,
o nosso grande erro e de que um dia mais tarde estaremos talhados para nos arrepender.
A imagem daquele rapaz de passo apressado faz-me reflectir que ele pode até nem perceber, como eu não percebia, mas não sabe a sorte que tem. Assim vão as cousas.
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