domingo, 11 de novembro de 2012

Segredo universal

Revisitando uma cena já vista anteriormente, embora com actores diferentes, o Dr. Pedro Passos Coelho terá sido objecto de escutas telefónicas que, de imediato levantaram as habituais suspeitas sobre o teor menos lícito ou, no mínimo ético, da relação entre o poder e os outros “poderes”, nomeadamente os do sector bancário.

Confrontado com a notícia das escutas o Primeiro-Ministro respondeu que nada tendo a temer relativamente ao seu conteúdo, permitiria que as mesmas fossem tornadas públicas.

Esta posição, assim tomada, nada teria de extraordinário à luz do velho princípio de que “quem não deve, não teme”, mas afasta a atenção da questão essencial que está subjacente ao próprio tema, isto é, aquele a partir do qual se fica a saber que o Primeiro-Ministro estava sob escuta durante uma determinada conversa.

Ora, este tema remete imediatamente para uma análise ambivalente, sendo a primeira das vertentes aquela que remete para o poder de um juiz para promover uma diligência de escutas - seja ao Primeiro-Ministro ou a qualquer outro cidadão - sem que exista, pelo menos aparentemente, qualquer indicio que o escutado esteja a ser alvo de uma investigação ou seja suspeito da prática de qualquer facto ilícito.

Esta conclusão é possível de extrair quando passa a ser público que a referida escuta ocorreu e que alvo da mesma era uma figura pública altura em que não falta quem, nomeadamente as mais relevantes individualidade hierarquia judicial e na investigação criminal, surgem de forma igualmente pública a revelar a inexistência de qualquer facto criminalmente censurável.

A questão que se coloca – e deve mesmo colocar-se – é, se tal é o caso, qual o motivo para a existência de uma diligência de escutas e quem é que as “encomendou”?

É que se a causa não existe o mesmo já não se pode dizer da respectiva consequência, bastando para o efeito que passe a existir a dúvida ou a suspeita pública, consoante a percepção de cada um, facto especialmente evidente num conjunto de situações que envolveram escutas ao anterior Primeiro-Ministro, das quais nunca resultou qualquer processo judicial mas que haveriam de minar drasticamente a respectiva credibilidade aos olhos daqueles que o haviam eleito.


Ligado a esta vertente surge sempre – literalmente – a difusão pública do conteúdo dessas escutas num qualquer órgão noticioso que remete para primeiro plano normalmente apenas uma parcela das mesmas em forma de parangona noticiosa que, independentemente da sua correcta ou incorrecta contextualização, contribui para o acentuar do efeito referido no parágrafo anterior.

A este efeito, que se convencionou chamar de “violação do segredo de justiça”, mas que eu entendo bastante mais adequado apelidar unicamente de “violação da justiça” uma vez que o elemento do “segredo” encontra-se manifestamente fora desta equação, caso contrário não seria violado.

Este problema, transversal a todos os Governos, parece, aparentemente, insolúvel independentemente da “vontade” normalmente demonstrada pelo respectivo titular da pasta da justiça, Procurador-Geral, entre outros.

Curiosamente (ou talvez não) quem parece menos envolvido na “luta” contra esta forma sub-reptícia de justiça “’pelas próprias mãos” são precisamente aqueles que têm o dever de decidir entre quem deve ser escutado e em que circunstâncias, nomeadamente pela voz dos seus representantes sindicais, a quem este tema não parece “incomodar” apesar de envolver directamente a respectiva classe.

Por isso mesmo facilmente se pode concluir que entre os silêncios de uns, as omissões de alguns e, por fim, os interesses inconfessados de outros, cada vez mais se “aponte o dedo” à crescente judicialização da política da qual resultará, num futuro próximo, que os eleitores passarão a escolher os seus representantes em função do poder arbitrário de um juiz ao invés da sua própria vontade. Assim vão as cousas.

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