domingo, 12 de agosto de 2012

A flagelação


A história está repleta de epítetos que apresentam um sufixo comum que os associam uma qualquer tendência social, económica ou religioso.

O sufixo “ismo” a que me refiro, designa mais exatamente os seguidores de tais correntes e teve sempre ao longo dos tempos uma maior ou menor dimensão consoante a amplitude do pensamento a que se encontra necessariamente associado.

A política, naturalmente, não“fugiu” nunca a este rótulo para a posteridade mas, como não podia deixar de ser, apresentar particularidades que a caracterizam de forma diferenciada das demais.

É bem verdade que, na sua essência, não divergem significativamente das demais, na medida em que se encontram intimamente direcionadas para grandes linhas da filosofia política, destacando-se em particular o Socialismo e o Comunismo, mas também o Liberalismo, o Conservadorismo, o Fascismo, entre outros.

Também na política sempre se verificou a tendência para acrescentar um prefixo às palavras a que se havia acrescentado um sufixo, que tem normalmente o significado de conferir aos respectivos seguidores uma linha de pensamento que apresenta algumas derivações face ao pensamento inicial.

O tal prefixo “neo” – que remete para a palavra novo - acaba por introduzir, a meu ver, algum sentimento de desorientação nos seus potenciais seguidores na medida em que passa a competir aos respectivos lideres demonstrar adequadamente o motivo pelo qual são adeptos de uma determinada corrente de pensamento mas não exactamente da mesma forma.

Ou seja, em bom rigor, explicar qual é a “novidade” subjacente a este novo entendimento – ou leitura – da corrente política que constitui a sua própria genética.

Dessa forma passou a ser parte integrante do léxico comum a utilização de referências ao “Neo-Liberalismo”,“Neo-Conservadorismo”, etc.

De igual modo o sufixo “ismo” foi igualmente objecto de sinalização em referências que remetiam directamente para pessoas individualmente consideradas, destacando-se nesse particular o famoso“Marxismo-Leninismo”.

Neste particular o mundo político apresenta uma proficuidade assinalável uma vez que a associação atrás referida passou a ser usada de forma tão recorrente que, como seria de esperar, se banalizou.

Dessa forma qualquer corrente interna de um partido político passou ela própria a ser merecedora do “famoso”sufixo, situação que normalmente é particularmente “visível” no momento da mudança de liderança sendo independente das vitórias – ou ausência das mesmas –do líder anterior ou da capacidade – ou falta dela – do novo líder.

No fundo, basta associar um conjunto de militantes à linha de orientação política de um líder passado, presente ou até futuro para se passar ter “direito” a uma espécie de perfilhação do respectivo pensamento.

Este tipo de “lógica” parece ter voltado agora ao de cima no Partido Socialista no qual surgem vincadas – e mesmo extremadas – as posições de quem se revia na linha política do Eng. José Sócrates e nas da actual liderença do Dr. António José Seguro.

Ora, aos olhos dos portugueses tudo isto parece, no mínimo, estranho.

Isto é, mal se percebe como é que um partido saído de uma derrota eleitoral que deu a maioria parlamentar aos seus principais “concorrentes” políticos da direita se “entretém” – aparentemente – a gerir questões de natureza interna que fundamentalmente a (quase) ninguém interessam – pelo menos fora do partido – quando deveriam procurar aglomerar as réstias de unidade que subsistem a qualquer derrota, no sentido de demonstrar à Sociedade que no futuro poderão novamente contar com eles.

Nada disso sucede, parece que afinal, qual cão que lambe as feridas, os males de que padece o Partido Socialista continuam bem vivos e sem perspectiva de cura à vista.

E porquê? Porque a história sempre nos ensinou que mesmo um líder pode mais facilmente “sobreviver” na memória colectiva independentemente dos seus erros de governação ou de liderança (veja-se o caso das correntes ligadas a lideres ditatoriais) do que a um líder fraco.

E essa parece ser a fórmula explosiva internamente no Partido Socialista, ou seja, parece ser mais razoável manter a associação ao líder anterior independentemente do descrédito actual do mesmo do que à nova liderança, simplesmente porque esta revela uma (nada) surpreendente falta de capacidade aglutinadora, exactamente a situação oposta à que se verificava anteriormente.

No meio disto tudo, e sem que se perceba precisamente porquê, circulam aqueles que se mantêm fielmente alinhados com o “Socratismo” e os demais que discretamente vão acentuando a desconfiança sobre a capacidade do “Segurismo” poder constituir uma alternativa ao actual Governo, tudo isto com a preciosa “ajuda” de um conjunto de comentadores televisivos que vai desenhando semanalmente a realidade política à medida dos respectivos interesses.

À distância, o Governo e os partidos que o sustentam vão acompanhando este desfasamento da sua principal “ameaça”como uma garantia de poder levar por diante as actuais políticas de austeridade sem o “transtorno” de uma oposição verdadeiramente digna desse nome.

Quando o Partido Socialista“resolver” acordar deste torpor talvez venha então a constatar uma nova realidade, aquela que torna evidente que a distância que o separa dos partidos do poder é já maior do que aquele que o separa dos partidos mais à esquerda. Talvez se chame a isto neo-realidade. Assim vão as cousas.

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