domingo, 15 de janeiro de 2012

O fim da inocência

Não sei se é por ser um “rapaz da minha idade” ou se por ser alguém que apesar da sua juventude apresenta um currículo académico assinalável, certamente revelador dos seus méritos intelectuais, mas confesso a minha simpatia pelo Ministro Alvaro Santos Pereira.

Não é meu propósito abordar as políticas seguidas pelo seu ministério, mas analisar o tipo de críticas que o próprio tem vindo a sofrer na tentativa de prossecução das mesmas.

Mais em concreto, o facto das mesmas apontarem para um certo apagamento pessoal numa pasta tão complexo e redobradamente importante nos tempos actuais.

Quando tomou posse o Dr. Alvaro Santos Pereira terá referido que pretender ser tratado simplesmente por Alvaro, assim sem mais, dispensando os formalismos habituais nestas ocasiões e especialmente gratos ao português, normalmente muito ciente dos respectivos títulos académicos, mesmo quando nem existem.

Assim foi, e o Alvaro mostrou desde logo a face de um “não-político”, de alguém aparentemente pouco habituado à mediatização inerente a qualquer cargo político, que talvez por sentir que a familiarização e uma boa empatia inicial com a imprensa reverteria a seu favor futuramente.

A questão é que a relação entre os média e os políticos é, no essencial, uma relação que não pode ser definida de cooperação mútua, mas sim como uma relação assente num interesse comum, de que um (o político) necessita de fazer passar as suas mensagens e de que o outro (o jornalista) precisa para dispor da “matéria-prima” inerente à sua função, isto é, as notícias.

Ora este interesse apesar de comum nem sempre é coincidente, nomeadamente quando a notícia que é transmitida não traduz fielmente a mensagem ou quando a mensagem não deveria constituir notícia.

No meio deste “conflito” está alguém (o jornalista) que irá definir, em função dos critérios editoriais do meio de comunicação a que pertence, se e como será difundida a mensagem.

Por isso mesmo não é de estranhar que o ministro Alvaro tenha “sentido na pele” os efeitos colaterais desta “teia” de contornos nem sempre muito claros, quando anunciou no Parlamento o “fim da crise” para o ano 2012.

Esta afirmação, que remete para outras de igual calibre do seu antecessor na pasta e que o tornaram mais “famoso” pela dimensão das suas gafes do que pela sua acção política, peca sobretudo desfasada realidade na medida em que é produzida no próprio dia em que era anunciada mais uma quebra abrupta do PIB e num contexto em que se procura transmitir às pessoas uma perspectiva para esse mesmo ano marcadamente negativa.

Num acto absolutamente normal o ministro Álvaro apressou-se a esclarecer que as suas palavras tinham sido mal interpretadas ou descontextualizadas, enfim, tudo aquilo a que nestas ocasiões se recorre para procurar minimizar os danos colaterais.

O que importa, a meu ver, realçar neste caso é que provavelmente a expressão em causa terá sido transmitida com o mesmo desprendimento com que anteriormente pedia para si mesmo um tratamento mais informal por parte dos jornalistas.

Dito de outra forma, o ministro Álvaro não terá avaliado adequadamente a repercussão de que a sua afirmação no Parlamento bem como a informalidade por si solicitada seriam analisados não à luz de um mero “lapsus linguae” ou da tentativa de posicionamento à margem dos políticos “tradicionais” mas como eventuais armas de arremesso contra si próprio logo que a oportunidade o permitisse.

Os órgãos de comunicação e a população em geral habituou-se a olhar os políticos como a personificação do “cinzentismo”, assente no formalismo das suas acções e das respectivas expressões labirínticas, quase sempre imperceptíveis aos ouvidos do cidadão comum.

Esta imagem não está ainda, infelizmente, em condições de sobreviver às investidas bem-intencionadas de um ministro Alvaro Santos Pereira que gosta de ser tratado simplesmente por Alvaro e que, como qualquer mortal, correrá sempre - fruto da sua crescente exposição pública - o risco de se equivocar.

Permito-me pensar que poderão suceder então duas coisas: ou se muda a forma de fazer jornalismo ou o próprio ministro muda a sua forma de agir, sendo que parece claro que a primeira opção carece de viabilidade prática.

Não resta então outra alternativa que não seja o do ministro Álvaro adoptar um estilo que certamente não pretende mas que lhe trará potencialmente menos dissabores futuros, excepto aquele que implicará para si próprio o progressivo afastamento da realidade, e nesse dia ter-se-á tornado um verdadeiro político. Assim vão as cousas.

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