domingo, 3 de maio de 2020

Diários de uma pandemia - 7ª semana

A nova semana de confinamento "prometia" novidades lá mais para o seu final havendo por essa altura a perspectiva de renovação (ou não) do estado de emergência com tudo o que isso implica em termos de limitações a determinadas liberdades que julgávamos todos por inquestionáveis mas que bem vistas as coisas não decorrem tanto de uma decisão presidencial ratificada pelo Parlamento mas de um dever geral de recolhimento a que apenas alguns resistem a cumprir, não que isso seja estranho posto que em qualquer momento haverá sempre aqueles que entendem haver uma lei geral e uma ausência de lei para eles próprios.

E é sobre liberdade que se deve falar no preciso momento que coincide com duas datas marcantes na vida democrática portuguesa: o 25 de Abril e o 1º de Maio. Em ambos os casos a realização de tais eventos foi desde cedo questionada por alguns, aplaudida por outros, mas admito que ignorada por ninguém. Se ambas as manifestações têm vindo a perder relevância mas não o significado é caso para dizer que este ano o significado superou porventura a relevância dos habituais discursos cada vez mais afastados do que se pretende celebrar e mais um prolongamento da retórica habitual em cada dia de sessão parlamentar.

Não me recordo de tantas manifestações espontâneas de quem entendeu celebrar à sua maneira sobretudo o 25 de Abril, cantando o "Grândola" à janela ou em colunas em alto e bom som, festejando como há muito não se via nas redes sociais. Talvez mais do que nunca as pessoas percebam o valor de sermos responsáveis pelos nossos destinos ou o significado de serem outros a dizer quais as nossas liberdades. Se calhar sempre souberam. Porventura estavam esquecidos. Se assim foi o vírus afinal nem tudo destruiu.

A imagem dessa liberdade tem sido expressa nos animais que à falta de humanos resolver aventurar-se num espaço quase sempre hostil mas que tendo sido deles está mais do que visto um dia voltará a ser deles, assim deixemos nós de os afastar e dar cabo do ambiente. Por aqui essa imagem surge nos gatos que sempre nos visitaram mas aos quais agora conseguimos ver a todo o momento e os pássaros, de tão distintos piares, que quase sempre se confundem com o barulho dos carros mas que agora cantam sem interrupções e se "atrevem" a vir comer umas migalhas de pão deixadas propositadamente sobre a mesa do jardim, sempre atentos a tudo, aos humanos e aos ditos gatos.

A semana anunciava também a perspectiva de um retorno controlado à empresa, numa espécie de regresso à normalidade ou mais propriamente à dita nova normalidade, num regime de escalas que se haveria de consolidar após o anuncio das medidas pós-estado de emergência por parte do Governo quinta-feira e que prevendo um desconfinamento anunciaram também a manutenção do regime obrigatório de tele-trabalho, deitando por terra as boas (embora tímidas) perspectivas de um abandono do posto de trabalho improvisado desde o dia 15 de Março.

Nunca como agora tantas pessoas viveram um momento de tamanha incerteza, perante a necessidade de evitar o alastramento do vírus que se encontra em queda há vários dias e a necessidade de sentir que à vida para além desse vírus que urge retomar, mas cuja duração, tal como no estado de emergência, dependerá afinal de contas de cada um de nós, com um plano que se conhece agora à cabeça alargado ou restringido a cada 15 dias.

Nas janelas vão surgindo os cartazes de um arco-íris que o sol se encarrega de tornar menos colorido e que anuncia que ficaremos todos bem. Será que vamos, ou melhor, será que somos capazes? Há 46 anos colocaram-se vários desafios e o principal seria o que fazer com a liberdade conquistada. Agora, simbolicamente, não será assim tão diferente.

Neste dia 3 de Maio, dia da mãe e inicio do estado de calamidade, haviam 25190 casos registado e 1023 óbitos.

  

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