O Primeiro-Ministro "confessou-se" surpreendido com a prescrição de alguns casos mediáticos na justiça e que, nas mesmas condições um qualquer cidadão anónimo não teria as mesmas possibilidades de ver um seu processo extinguir-se pela inexorável passagem do tempo, comum a qualquer ser vivo mas - aparentemente - ainda mais célere no que aos prazos judicias diz respeito.
Devo dizer que concordo com esta dupla visão sobre um tema que voltou a conhecer recentemente novos episódios e parece que terá ainda mais desenvolvimentos nos tempos que se avizinham, facto que leva Passos Coelho a admitir que decorrerá de tais situações um sentimento de injustiça na sociedade portuguesa.
Em bom rigor estas conclusões "merecerão" uma opinião favorável por parte significativa da população na medida em que não serão diferentes da opinião generalizada dessa mesma população e é, sem duvida, esta a questão que merece reflexão.
A prescrição de qualquer processo é uma aberração judicial onde entroncam diversos factores todos eles inadmissíveis numa Sociedade presumivelmente justa e em que um dos seus pilares - a justiça - é a base da garantia da protecção da lei e do direito de qualquer cidadão em igualdade de circunstâncias, não fosse essa mesma justiça, por definição de conceito, "cega".
Tais factores são em concreto os seguintes:
Em primeiro lugar o sistema judicial não "consegue" nos processos mais complexos (e mais mediáticos) criar meios para, dentro dos prazos legais, poder fazer justiça, isto é, condenar os culpados e absolver os inocentes. Pelo contrário, a "teia" legal que se tece ao invés de emaranhar que nela "pousa" consciente ou inconscientemente o que faz é prender a própria aranha que fica, dessa forma, refém de si própria.
Uma segunda questão que resulta claramente da primeira e será mesmo a sua principal causa é a complexidade legalmente aceite de um sistema de recursos e de outros "expedientes dilatórios" que "arrasta" qualquer processo o tempo suficiente para ao fim de algum tempo terminar sem culpados nem inocentes, mas apenas com processos sem julgamento.
Por fim é preciso entender que as leis que os juízes não parecem conseguir aplicar são precisamente aquelas que são emanadas da sede do poder legislativo - a Assembleia da República - onde parte significativa dos seus membros são advogados, isto é e para quem não tenha percebido onde se pretende chegar, aqueles que fazem as leis são os mesmos que as hão-de "esgrimir" posteriormente em tribunal, já para não falar do papel de algumas Sociedades de Advogados no "precioso" papel de assessoria aos diversos grupos parlamentares...
Poderia juntar-se um quarto argumento que resulta da aparente "fragilidade" do papel do Ministério Público que parece cada vez mais incapaz de sustentar em tribunal as suas próprias acusações, "motivando" recurso atrás de recurso até ao arquivamento ou prescrição final.
A aberração judicial a que me referi anteriormente é, pois, o resultado de um sistema judicial falível e, porventura, em falência aos "olhos" dos portugueses, da qual nada mais resulta do que uma não-justiça, ou seja, a denegação da justiça que, em bom rigor, o próprio "beneficiário" da prescrição deveria preferir porque, tal como fica subentendido pelas palavras do Primeiro-Ministro, dessa situação resulta mais facilmente a percepção geral de que essa foi apenas a forma de não vir a ser condenado.
A justiça é também conhecida por ser surda e muda. Confesso não concordar nem tão-pouco algum dia ter percebido o alcance e significado desta frase. A justiça tem, definitivamente, de ter uma visão que distinga o bem do mal, ouvir todas as partes e saber proferir decisões justas. O que se passa actualmente é que tal não sucede porque essa mesma justiça actua como um refém, isto é, incapaz de ser livre. Assim vão as cousas.
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