Em 14 de Fevereiro de
1989 o mundo tornou-se consciente de uma realidade que remetia para uma
vertente da relação entre o mundo ocidental e o mundo islâmico, até aí
provavelmente ignorada.
Nesse mesmo dia, o líder espiritual e político do povo iraniano, o ayatollah Khomeini, condenou à morte um escritor até aí pouco conhecido do grande público (Salman Rushdie), através de um decreto religioso (fatwa), tendo por base a acusação de blasfémia contra o Islão, devido à publicação de um livro (Versículos Satânicos), situação que obrigou o escritor a viver em quase clandestinidade durante largos anos, até que, muito recentemente, o referido decreto foi revogado.
Alguns anos mais tarde (em 2005) um jornal dinamarquês (Jyllands-Posten) resolveu publicar umas caricaturas que satirizavam o profeta Maomé, originando uma espiral de violência, uma vez mais pelo carácter blasfemo das mesmas, à luz do princípio islâmico da proibição das representações visuais do profeta.
Como consequência das ameaças de morte e recompensas pelo seu assassinato de que foram alvo, os cartoonistas (e o editor do jornal) passaram a “viver” escondidos, numa espécie de reclusão forçada por um julgamento sumário.
Mais recentemente e a propósito de um vídeo considerado anti-islâmico que começou a circular no YouTube, o mundo árabe voltou a insurgir-se contra o ocidente, levando a novos e cada vez mais graves incidentes, dos quais resultaram diversas mortes, incluindo a de um embaixador norte-americano.
De acordo com a minha perspectiva a súmula destes (e de outros menos mediáticos) pode colocar-se em dois planos distintos.
O primeiro é o do “confronto” entre a liberdade de informação e a repressão dessa mesma liberdade por parte de alguns sectores islamitas (embora não exclusiva destes), através de uma mais do que evidente intolerância religiosa, perante o mundo ocidental, não islâmico.
A questão que se coloca é se a primeira deve simplesmente soçobrar perante a segunda face à desproporcionalidade das consequências que lhe estão normalmente associadas, questão esta que remete para o segundo plano de análise, ou seja, o dos limites da liberdade de imprensa.
Se for previsível admitir que a consequência habitual da divulgação de uma determinada notícia (mesmo que seja em forma de cartoon) resultaram distúrbios e a morte de inocentes, deverá essa mesma divulgação ser impedida ou, no mínimo, revista na respectiva forma?
Os puristas da liberdade de expressão dirão, obviamente, que não, que se trata de um valor supremo, inalienável e não condicionável por outros valores.
Contudo, a liberdade de expressão não é, certamente, a única liberdade que existe, na medida em que “corre” em paralelo com outras de igual ou mesmo superior valor, entre os quais o direito à vida.
A questão a meu ver é que, quando um direito se sobrepõe a um outro deixa de ser, na maioria dos casos, um direito, mas uma forma de tirania, quando a liberdade de uns é condicionada pela liberdade de outros “justificada” pela intemporal máxima de que os fins justificam - aparentemente – todos os meios.
Poder-se-ia esperar que o “sacrifício” de algumas vidas poderia, no limite, ser o “contributo” necessário para a resolução do problema. Contudo, este argumento perdeu há muito a sua validade, face à realidade dos factos.
E esta realidade - o segundo dos planos iniciais - é que, quase sempre aquilo que se segue à difusão de imagens ou conteúdos considerados ofensivos, seja por movimentos islâmicos ou por outras confissões religiosas, resulta exclusivamente do aproveitamento de um grupo mais ou menos restrito para, em nome da fé, passar as suas próprias mensagens de ódio, as quais dificilmente terão alguma conexão, próxima ou remota, com essa mesma fé.
Em suma, é minha convicção que entre os idealismos de uns e o fundamentalismo de outros o problema irá, no essencial, manter-se no tempo, com tendência para um acentuado agravamento de uma situação que, sabendo-se como começa, também se sabe como acaba. Assim vão as cousas.
Nesse mesmo dia, o líder espiritual e político do povo iraniano, o ayatollah Khomeini, condenou à morte um escritor até aí pouco conhecido do grande público (Salman Rushdie), através de um decreto religioso (fatwa), tendo por base a acusação de blasfémia contra o Islão, devido à publicação de um livro (Versículos Satânicos), situação que obrigou o escritor a viver em quase clandestinidade durante largos anos, até que, muito recentemente, o referido decreto foi revogado.
Alguns anos mais tarde (em 2005) um jornal dinamarquês (Jyllands-Posten) resolveu publicar umas caricaturas que satirizavam o profeta Maomé, originando uma espiral de violência, uma vez mais pelo carácter blasfemo das mesmas, à luz do princípio islâmico da proibição das representações visuais do profeta.
Como consequência das ameaças de morte e recompensas pelo seu assassinato de que foram alvo, os cartoonistas (e o editor do jornal) passaram a “viver” escondidos, numa espécie de reclusão forçada por um julgamento sumário.
Mais recentemente e a propósito de um vídeo considerado anti-islâmico que começou a circular no YouTube, o mundo árabe voltou a insurgir-se contra o ocidente, levando a novos e cada vez mais graves incidentes, dos quais resultaram diversas mortes, incluindo a de um embaixador norte-americano.
De acordo com a minha perspectiva a súmula destes (e de outros menos mediáticos) pode colocar-se em dois planos distintos.
O primeiro é o do “confronto” entre a liberdade de informação e a repressão dessa mesma liberdade por parte de alguns sectores islamitas (embora não exclusiva destes), através de uma mais do que evidente intolerância religiosa, perante o mundo ocidental, não islâmico.
A questão que se coloca é se a primeira deve simplesmente soçobrar perante a segunda face à desproporcionalidade das consequências que lhe estão normalmente associadas, questão esta que remete para o segundo plano de análise, ou seja, o dos limites da liberdade de imprensa.
Se for previsível admitir que a consequência habitual da divulgação de uma determinada notícia (mesmo que seja em forma de cartoon) resultaram distúrbios e a morte de inocentes, deverá essa mesma divulgação ser impedida ou, no mínimo, revista na respectiva forma?
Os puristas da liberdade de expressão dirão, obviamente, que não, que se trata de um valor supremo, inalienável e não condicionável por outros valores.
Contudo, a liberdade de expressão não é, certamente, a única liberdade que existe, na medida em que “corre” em paralelo com outras de igual ou mesmo superior valor, entre os quais o direito à vida.
A questão a meu ver é que, quando um direito se sobrepõe a um outro deixa de ser, na maioria dos casos, um direito, mas uma forma de tirania, quando a liberdade de uns é condicionada pela liberdade de outros “justificada” pela intemporal máxima de que os fins justificam - aparentemente – todos os meios.
Poder-se-ia esperar que o “sacrifício” de algumas vidas poderia, no limite, ser o “contributo” necessário para a resolução do problema. Contudo, este argumento perdeu há muito a sua validade, face à realidade dos factos.
E esta realidade - o segundo dos planos iniciais - é que, quase sempre aquilo que se segue à difusão de imagens ou conteúdos considerados ofensivos, seja por movimentos islâmicos ou por outras confissões religiosas, resulta exclusivamente do aproveitamento de um grupo mais ou menos restrito para, em nome da fé, passar as suas próprias mensagens de ódio, as quais dificilmente terão alguma conexão, próxima ou remota, com essa mesma fé.
Em suma, é minha convicção que entre os idealismos de uns e o fundamentalismo de outros o problema irá, no essencial, manter-se no tempo, com tendência para um acentuado agravamento de uma situação que, sabendo-se como começa, também se sabe como acaba. Assim vão as cousas.
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