Muito sinteticamente tenho uma teoria de vida que, no essencial, entende que todos nós nos tornamos, com o passar dos anos, piores pessoas.
Esta teoria de natureza eminentemente pessimista assenta numa observação pessoal da forma como as influências que nos são exteriores nos moldam e, sobretudo, nos deformam.
Tudo começa na fase singela da nossa vida e que coincide com a entrada na escola em que a nossa capacidade e disponibilidade para comunicar com quem nos rodeia é quase total, sem subterfúgios, sem segundas intenções, o seja, os nossos comportamentos são genuínos e sinceros.
O sinal evidente de tal estado de espírito é o número considerável de amizades que se formam nessa altura bem como a espontaneidade com que elas surgem, algo que nunca mais terá paralelo na nossa vida.
A partir daqui a tendência para a criação de auto-defesas em relação a tudo o que nos rodeia inicia um percurso cuja amplitude difere substancialmente de pessoa para pessoa.
Numa segunda fase do nosso crescimento, que resulta da nossa própria evolução na carreira académica verifica-se um fechar do círculo relativamente aos que nos rodeiam, havendo uma selecção mais ou menos clara do nosso leque de amizades mas sobretudo uma anti-selecção de todos aqueles que não entendemos não ser dignos da mesma.
E como de uma forma geral todos agem de acordo com este mesmo parâmetro passa a haver um sentimento de desconfiança entre todas as pessoas.
E nem se diga que na base dessa desconfiança exista algum sintoma emergente do espírito de competitividade, na medida em que nesta fase o resultado é eminentemente pessoal e não um objectivo colectivo.
O ponto alto da consolidação da nossa personalidade dá-se com a entrada no mundo laboral, isto é, com o surgimento do sentimento de competição no seu estado mais puro.
O momento em que as vontades individuais colidem boa parte das vezes entre elas e não raramente com os interesses corporativos.
O espírito de colaboração e entreajuda normalmente soçobra quando dois interesses entram em conflito e então o interesse colectivo são secundarizados em função de um interesse meramente pessoal.
No essencial é desta forma que tudo funciona ainda que qualquer pessoa possa de forma sincera alegar que em caso algum o possa ou sequer pretenda fazer intencionalmente.
A competitividade é, no limite, o inimigo número um da solidariedade e é algo que para o bem e para o mal apenas nos afecta com a idade e com o crescimento das nossas próprias responsabilidades.
As sociedades e os governos são pois o reflexo dos comportamentos mas também das omissões dos seus membros.
Verifique-se a este propósito o que se passa actualmente no Continente africano.
Enquanto a Europa e os Estados Unidos andam “entretidos” a tentar perceber como é que chegou a este estado de coisas, ou por outras palavras, como é que foi possível gastar tantos recursos sem ter condições para tal, chegam-nos notícias avassaladoras de uma região em África em que milhões de vidas estão em risco por falta de condições elementares de vida e por novos focos de guerra.
Todas aquelas imagens de miséria e de fome extrema que julgávamos quase definitivamente ultrapassadas ao longo das últimas duas décadas ressurgem aos olhos de (quase) todos.
Ao mesmo tempo que o mundo ocidental estimula uma espécie de fábrica global de consumo, muitas das vezes para satisfação de necessidades supérfluas ou, pior ainda, para alimentar máquinas de guerra um pouco por todo lado, “esquecemo-nos” que noutros hemisférios existiam necessidades e carências bem mais básicas e certamente menos onerosas.
Esta situação degradante só pode ser “justificada” precisamente pelo efeito em cadeia da teoria que procurei explicar no inicio desta dissertação.
Ou seja, os povos passaram a olhar tanto para eles próprios e para as suas necessidades individuais que ignoraram as consequências que daí adviriam e agora, que já não podem ignorar, talvez seja já tarde demais.
Será que poderiamos ter agido de outra forma?
A verdade é que nós sempre tivemos a possibilidade de escolha, essa mesma possibilidade que continuamos a negar a quem mais precisa. Assim vão as cousas.
Sem comentários:
Enviar um comentário