A entrada de uma empresa chinesa no capital da EDP e da REN veio lançar para a ordem do dia alguns aspectos relevantes na conjuntura actual, nomeadamente a exposição das suas principais empresas ao capital estrangeiro.
Não é este, contudo, o ângulo pelo qual esta questão merece a minha particular atenção.
Durante o mandato e meio do governo do Eng. Sócrates ficaram de certa forma famosas as aparições públicas quer do próprio quer de outros membros do Governo junto de líderes de regimes cuja relação com as regras da democracia é, no mínimo, questionável.
Na retina ficaram em particular as relações de proximidade com o presidente Venezuelano Hugo Chavez e o agora ex-lider Líbio Muammar Kadafi, apenas para citar alguns.
Em causa estavam mais do que relações pessoais as relações de natureza comercial entre um país com as dificuldades reconhecidas na sua balança comercial e países denominados emergentes ou em expansão.
O ponto denominador comum a qualquer dos países atrás referidos é a sua posição privilegiada no quadro dos países produtores de petróleo e outras riquezas (por exemplo o gás natural), a moeda de troca predilecta para potenciais parceiros como Portugal.
Assim não foi de estranhar as trocas de abraços, as juras de amor eterno e as mil e uma palavras de circunstância com que eram selados os diversos acordos bilaterais celebrados ao abrigo deste interesse mútuo.
O problema – pelo menos para alguns – é que, em certas circunstâncias, pelo menos um dos subscritores é (ou era), em termos práticos um ditador.
Ora, por inerência um ditador não é uma pessoa de confiança e muito menos alguém com que se devam celebrar acordos ou parcerias, na medida em que parte daquilo que o seu próprio país tem para oferecer é obtido à custa do sacrifício dos respectivos povos.
Não faltou portanto nessas ocasiões quem tenha levantado o dedo à relativização da componente ética e moral de tais acordos, à luz dos princípios básicos dos direitos, liberdades e garantias.
Essas mesmas vozes voltaram a ouvir-se aquando da queda e posterior execução do ditador líbio tendo-se igualmente criado a convicção que os negócios com o “suis generis” líder da República Bolivariana da Venezuela teriam os seus dias contados.
Se em relação à “questão” Libia a mesma se resolveu por si própria com a morte do General e líder supremo, a situação particular da Venezuela foi abordada de forma tímida (e quase despercebida) através de uma visita do ministro dos Negócios Estrangeiros, o Dr. Paulo Portas, a esse território.
Esta visita carrega em si o simbolismo da necessidade de manter os laços comerciais criados durante o anterior Governo e que, creio, não podem ser simplesmente abandonados quanto mais não seja porque neste mesmo país residem cerca de meio milhão de portugueses.
A ilação geral que se pode retirar de tudo isto é que qualquer país que ao abrigo dos seus próprios princípios democráticos pretenda deixar de negociar com outros países sob o pretexto de serem regimes autocráticos ou ditatoriais, correrá sérios riscos de isolamento.
Tal resulta do facto de, infelizmente, quase todos os grandes produtores de riquezas naturais deste nosso Mundo serem precisamente liderados por regimes de natureza não democrática.
E será certamente por isso que ninguém estranhou ou ousou questionar que aqueles que agora se anunciam como os grandes investidores do presente e do futuro em Portugal, sejam precisamente aqueles que impõem internamente uma das mais duradouras ditaduras da história da humanidade. Assim vão as cousas.
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