Não sei se este é um daqueles momentos a que se convencionou chamar de “sinais dos tempos”, mas continua a ser difícil para mim entender o motivo pelo qual alguns órgãos de soberania e ou titulares de cargos públicos utilizam as vulgarmente denominadas redes sociais como autênticos órgãos oficiais de comunicação.
Poderia, como principio, admitir que tal se deve à convicção de, por essa via, se chegar a um razoável número de cidadãos.
No entanto, não creio que tal possa ser justificação bastante para tal.
As redes sociais são um local à escala mundial onde literalmente “tudo se passa”, desde aquilo que é relevante até à mais profunda banalidade.
Sendo, por isso mesmo, um espaço a que poderemos chamar de “democrático” não é, ainda assim, um espaço totalmente livre.
Tal resulta do facto de nem todos os destinatários dos comunicados mais ou menos oficiais estarem necessariamente “ligados” a qualquer destes novos espaços de interligação social, pelo que a repercussão pública de qualquer notícia apresenta desde logo a condicionante de apenas se destinar a que tenha aderido previamente aos referidos espaços.
Ainda assim e para quem conheça minimamente o funcionamento destas redes, não bastará estar “conectado” ou registado é também necessário que se tenha aderido à respectiva página através de uma opção que tem ela própria um carácter duvidoso, o “famoso” botão do “like”, ou em bom português, o botão do “gosto”.
Referi-me ao carácter duvidoso desta opção porque ela própria não admite o seu contrário, isto é, uma opção de “don’t like” ou “não gosto”, ou seja, ou se adere porque se gosta ou nada feito.
A “modernidade” que parece estar associada a esta nova forma de comunicação constitui, de acordo com o meu entendimento, uma desvalorização do carácter institucional que deve presidir à tomada pública de qualquer dirigente político e de sobremaneira quando esteja em causa um órgão de soberania.
Não está tanto em causa a eventual necessidade de redefinição das formas de “chegar” à população em geral, está em causa, isso sim, a dignidade formal que terá sempre de estar subjacente a essas formas e a garantia da universalidade das mesmas.
A não ser assim estaremos perante uma redução do próprio conceito de “democracia participativa” a que apenas poderá aceder quem disponha dos meios para tal, em prejuízo da necessária pluralidade.
A “qualidade” de qualquer democracia desenvolve-se para capacidade de criar condições para que todos nela participem sem restrições.
A “democracia das redes” é uma ilusão de democracia porque tem associada uma ilusão de pluralidade, em que a difusão das notícias surge de forma diferida através dos canais de notícias que tornam público aquilo que inicialmente foi dado a conhecer apenas a alguns, e quando tal acontece será necessariamente objecto de trabalho jornalístico com maior ou menor rigor.
Por outro lado tem-se verificado que o teor das comunicações efectuadas através das redes sociais confunde-se, não raras vezes, com uma forma indisfarçada de transmissão de mensagens mais facilmente assimiláveis com opiniões de natureza pessoal do que com o suposto carácter oficial das mesmas.
Esta conflitualidade explícita entre a esfera da opinião pessoal e a opinião oficial cria uma nebulosidade insanável relativamente ao formalismo que deve nortear o carácter oficial da informação que é transmitida pelos órgãos de soberania e dos detentores de cargos públicos.
O uso generalizado de uma linguagem do tipo “sms” ou “tweet” até poderá ter subjacente a facilidade da sua transmissão, mas em caso algum a sua real compreensão. Assim vão as cousas.
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