domingo, 23 de outubro de 2011

A verdade....

Durante o período eleitoral e logo após ter tomado posse como Primeiro-Ministro o Dr. Pedro Passos Coelho afirmou que não iria utilizar a célebre forma de escape normalmente utilizada por qualquer novo Governo, abstendo-se de invocar a "pesada herança" do Governo que o precedeu.

Fez bem em anunciar tal propósito deixando, em termos práticos, a tarefa sempre oportuna de justificar algo que se apresenta de difícil justificação para os seus ministros mais políticos, surgindo naturalmente o Dr. Miguel Relvas à cabeça dessa incumbência.

A verdade, porém, é bastante mais complexa do que a simples justificação do presente com factos do passado poderá representar.

O segundo mandato do Governo do Eng. José Sócrates enfermou fundamentalmente de 3 grandes pecados.

O primeiro foi o de não dispor de uma maioria parlamentar que lhe desse suporte às principais medidas que haveria que tomar face à mais do que evidente complexidade da situação das finanças pública portuguesas.

Essa margem de manobra, esse quase fundo de maneio de que o Dr. Pedro Passos Coelho dispõe actualmente garante-lhe a viabilização dos sucessivos planos de austeridade, outrora chamados de Planos de Estabilidade e Crescimento.

O Eng. Sócrates não soube ou não quis negociar as necessárias maiorias parlamentares e por isso mesmo colocou-se à mercê dos "timings" eleitoriais da oposição, mas também refém de si próprio ao assumir uma politica económica aquém do desejado, porventura convicto da impossibilidade de fazer passar outras medidas certamente mais graves, mas porventura mais necessárias.

O segundo pecado foi o de querer passar uma imagem de um Portugal (quase) imune à crise quando eram evidentes os sinais de deterioração da nossa economia.

Ao mesmo tempo que o fazia dava normalmente sinais contrários disso mesmo anunciando nos planos de austeridade, ditos de estabilidade e crescimento, numerados pela respectiva letra romana.

Com tudo isto a confiança de quem por duas vezes o havia eleito para o cargo foi-se progressivamente esfumando, aliado a uma crescente de novos e velhos "opinion makers" que diáriamente desmontavam as novas e velhas políticas económicas do Governo.

Em política é muito comum usarem-se expressões que pretendendo afirmar uma coisa parecem querer dizer outra substancialmente diferente, mas para o cidadão comum uma mentira será sempre isso mesmo, e não apenas uma forma de faltar à verdade.

O terceiro pecado foi o de não conseguir proceder entre mandatos à renovação de cargos ministeriáveis, procurando trazer para a primeira linha da política personalidades sobre quem se pudesse igualmente renovar a confiança.

Ao contrário do que normalmente se pretende fazer crer a competência não é uma característica exclusiva daqueles que se situam pretensamente fora dos aparelhas partidários.

A questão é de sobremaneira simples: ou se é ou não se é competente.

Os governos do Eng. Sócrates ficam intimamente ligados à actuação de alguns ministros tidos como independentes mas lamentavelmente com reduzida capacidade política, ficando mais na memória colectiva pelas suas gafes e omissões do que pelos seus méritos governativos.

A factura nestes casos é passada, entregue e paga por quem teve a tarefa de os escolher, ou seja, o próprio Primeiro-Ministro.

O epílogo destes 3 pecados dá-se com a assinatura do memorando de entendimento com a troika, com quem aliás havia feito juras de jamais governar... e nisso acabou por ter razão.

Involuntariamente ou não, ficará para a história um dia desvendar.

Consta que é na hora da morte que surge o arrependimento. 

Não creio, contudo, que a morte política sobrevenha tal estado de espírito, mas quer acreditar que o Eng. Sócrates no momento em que percebe que jamais teria uma terceira oportunidade de reeleição terá igualmente percebido que seria a ele próprio e somente a ele que seriam imputadas as responsabilidades pela situação actual do país. Assim vão as cousas.

(Continua na próxima semana)

1 comentário:

  1. António Laureano Santos23 de outubro de 2011 às 11:35

    Meu Caro, sem avançar muito, acho que o governo Sócrates padecia de mais pecados. Nomeadamente do próprio Sócrates a quem faltou humildade e honestidade. A acrescer, acho que percebeu mal as teorias de Keines, tendo "apostado" a massa que pediu emprestada lá fora em sectores da economia que apenas beneficiaram alguns (este alguns são fáceis de encontrar: basta verificar quais as parcerias público-privadas que foram outorgadas).
    Um abraço e continua o bom trabalho.

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