Ontem ouvi o Professor Jorge Miranda, com a sua reconhecida sapiência, a falar da necessidade dos portugueses voltarem a ter uma noção de patriotismo.
Quem conhece o percurso cívico do Professor Jorge Miranda saberá certamente que ele não se refere ao conceito caduco de patriotismo, ou seja, aquele que nos remete para o a filosofia do “orgulhosamente sós”.
Fala, a meu ver, da necessidade dos portugueses conseguirem olhar para si mesmo como um povo com imensas qualidades, com uma História com um registo universal e que é membro de pleno direito de uma Comunidade de países a que se convencionou chamar de União Europeia.
Este “chamamento” é tão mais oportuno quando este nosso País atravessa aquela que será não apenas a maior crise deste e do último século, mas sobretudo o maior ataque à sua soberania.
Os sinais são por demais evidentes e, no meu entender, surgem fundamentalmente de três frentes. Vejamos.
Nos últimos dias as tristemente (a expressão é minha) famosas agências de notação financeira aceleraram as descidas do “rating” de Portugal, classificando-o a um nível acima de “lixo”.
Ou seja, estas empresas privadas, agindo em função de classificações que as próprias definem mas sem que se perceba sob a orientação de quem, “arrasam” literalmente as perspectivas (por menores que sejam) de podermos reverter a actual situação economica do país.
Mas quem são estas agências de notação?
São precisamente as mesmas que em 2008 atribuiam os mais elevados “ratings” a empresas como a Lheman Brothers, a AIG, o Citigroup, a Fannie Mae, a Freddie Mac entre muitas outras e que de um dia para o outro ruiram com se de um jogo de cartas se tratasse, mas com um claro efeito dominó.
O zelo com que agora “olham” para Portugal e para os nossos principais bancos longe de ser um motivo de orgulho é, antes de mais, uma consequência da mais do provável omissão intencional de supervisão relativamente a muitas empresas e muitos Estados, de onde resultou a crise económica internacional.
Quem atribuiu a legitimidade a estas empresas para Nos categorizarem como “lixo” e Nos arrastarem para a falência?
A minha resposta é: ninguém!
No entanto parece haver alguém que poderá ter um interesse “sombrio” nestes sucessivos “down-rating” a que temos vindo a ser sujeitos.
Falo, naturalmente, daqueles que passaram a integrar a maior parte dos nossos temas de conversa e sobretudo dos nossos políticos, ou seja, os “mercados”.
Mais uma vez quando falamos de “mercados” falamos de algo ou de alguém de quem não se conhece o rosto e o nome próprio mas de quem sabemos, isso sim, que à custa do crescimento da dúvida sobre a nossa capacidade em cumprir as nossas obrigações relativas à chamada “dívida soberana” Nos impõe juros desmesurados sempre que se verificam necessidades de financiamento através dos chamados leilões de dívida pública.
O que é imperceptivel nesta imposição é que ela é, a meu ver, contraditória em sim mesmo.
Ou seja, se há a percepção de que o Estado Português não estará em condições de cumprir com as obrigações emergentes da titularização da dívida pública então não será que ainda mais dificil será quanto maiores forem os juros que cobra?
Em bom rigor, Portugal necessita de contraír novas dívidas apenas para pagar os juros dessa mesma dívida.
Por outro lado, é um contracenso absoluto que sempre que Portugal recorre aos referidos leilões tenha mais procura do que oferta, isto é, os mesmos que duvidam da nossa capacidade em cumprir as nossas obrigações são precisamente aqueles que correm a emprestar-nos dinheiro.
Tudo isto tem, a meu ver, um nome, e esse nome é nem mais nem menos que a especulação pura, precisamente a mesma que move as agências de rating.
Por fim, temos o “gigante” alemão, personalizado na Senhora Merkel, que assumiu definitivamente as rédeas de uma Europa a 27 mas que no essencial parece cada vez mais desejar funcionar a 6, tal como nos seus primórdios.
A naturalidade com que, de forma critica, a Senhora Merkel aborda no parlamento alemão a nossa situação económica é o espelho fiel de uma Europa que perdeu (será que alguma vez o teve?) o sentido de solidariedade.
Uma Europa que ao invés de criar mecanismos de protecção em função da diversidade dos próprios Estados engendrou politicas que uniformização de objectivos económicos que tarimbam todos os membros da União Europeia de igual modo como se todos “andassem” à mesma velocidade.
Em bom rigor a Senhora Merkel o que faz é estender a passadeira vermelha aos tais “mercados” e a todos aqueles que os alimentam incluindo, claro está, as ditas agências de rating.
Vivemos hoje num modelo de federalismo europeu cada vez menos envergonhado.
Tudo isto deveria, em bom rigor, levar a um cerrar de fileiras por parte dos Portugueses para fazermos face a estas “ofensivas” deliberadas.
E de que forma é que tal poderá suceder?
Começando pela consciencialização por parte da Nossa classe política da necessidade de falarmos a uma só voz para o exterior, deixando de lado os cada vez maiores sinais de clivagens politicas entre os principais partidos.
Independentemente das responsabilidades externas nos nossos problemas, foi sem duvida a Nossa classe política que ao longo de mais de 30 anos nos colocou “a jeito” para este jogo de submissão e se lhes cabe grande parte da fatia da actual crise cabe-lhes agora a quase totalidade da responsabilidade de criar condições para dela sairmos.
À sociedade civil compete a obrigação moral de exigir a essa mesma classe politica que cumpra os Nossos desígnios e faça prevalecer as Nossas aspirações colectivas.
No próximo dia 5 de Junho as pessoas poderão já começar a demonstrar uma intenção firme de contribuir para a solução e deixar de se queixar apenas do problema, não deixando de exercer (como têm progressivamente feito) o seu direito inalienável de voto.
É também por aqui que entendo que passa a noção de patriotismo de que fala (e bem) o Professor Jorge Miranda. Assim vão as cousas.
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