domingo, 27 de março de 2011

A última ceia

Não estou de forma alguma convicto de ter qualquer dom adivinhatório especial.

Mas da mesma forma que assim o afirmo não posso deixar de verificar que o que se passou na quarta-feira passada confirmou pelo menos 3 das minhas convicções sobre as quais tive ocasião de dissertar anteriormente.

A primeira delas ("Realpolitik", 30/01/2011) resultou da convicção de que o dia da reeleição do Prof. Cavaco Silva deu inicio à contagem descrescente para a queda do governo e o mais do que provável regresso ao poder do PSD.

Disse-o porque tudo começou a apontar para esse cenário no próprio discurso na noite da eleição e de sobremaneira acentuado no discurso posterior de tomada de posse.

Se não é imaginável a "convivência" entre dois orgãos de soberania em que ambos parecem desconfiar um do outro, muito menos possível seria antecipar uma possível convergência.

Percebeu-se claramente que iriam doravante tolerar-se, embora não se soubesse até quando.

O silêncio a que se resignou o Palácio de Belém na questão do PEC IV não foi mais do que uma demonstração da ausência de qualquer intenção real de mediação entre as posições públicamente assumidas pelos partidos.

Atrevo-me, inclusivé, a admitir que o dia de ontem ficou de certa forma traçado há 18 meses atrás quando o Presidente da República nada fez para contribuir para a concretização de um modelo de maioria parlamentar, nomeadamente entre os dois principais partidos.

A história ha-de registar aquelas que foram as suas acções como Presidente da República, mas muito mais aquelas que foram as suas omissões e os seus silêncios "cirurgicos".

O segundo "cenário" ("Maioria de razão", 26/12/2010) que antecipei em tempos é o de que das próximas eleições resultará, muito provavelmente, uma maioria parlamentar, senão mesmo absoluta.

Confirma-se plenamente a minha convicção de que Portugal só teria a ganhar com a alteração do modelo eleitoral, do qual resulte sempre uma maioria absoluta nas eleições para a Assembleia da República.

Olhe-se o problema por onde for, a verdade é que Portugal é ingovernável em condições como as que se viveram nos últimos 18 meses.

Num país onde (quase) tudo falta não é possível manter um rumo político (seja qual for o governo) ao sabor das tácticas eleitorais dos diversos partidos da oposição, como se de uma Espada de Damocles se tratasse.

A terceira convicção ("Maioria de razão", 26/12/2010) é a de que no essencial ontem passou-se mais um "cheque em branco" aos partidos da oposição.

Todos ouvimos as posições assumidas pelos diversos partidos com representação parlamentar, seja no apoio ao famigerado PEC IV ou em oposição ao mesmo.

O que ninguém ouviu foram as alternativas ao plano de austeridade, no fundo saber-se como é que poderemos chegar aos mesmos resultados sem ter de continuar a vergar as costas a medidas que nos parecem cada vez mais injustas.

O que também ninguém ouviu foi dizerem-nos se a eventual necessidade de resgate financeiro do país pelo recurso ao FMI implicará ou não a imposição de novas medidas de austeridade que algumas pessoas anteciparam, aos pé das quais o defunto PEC IV parecerá um "mal menor".

Nada de nada.

Todos - sem excepção - precipitaram-se na criação de condições para a existência de eleições antecipadas, apenas olhando para os seus próprios calendários politicos.

A esquerda esfregará as mãos de contente até chegar à conclusão que uma vez mais os portugueses irão continuar a escolher outros, certamente provenientes de um espectro politico diametralmente oposto ao seu.

A direita olha já para o "pote" que parece surgir ao virar da esquina, sem que se saiba como é que vai desatar o nó górdio em que nos meteram.

Por tudo isto, espero sinceramente que uma outra convicção ("O impecilho", 28/11/2010) que tive igualmente ocasião de expressar esteja profundamente errada e essa convicção é de que ainda possamos a curto prazo chegar à conclusão que nos enganaram uma vez mais. Assim vão as cousas.

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